Guerra, Trump e China possibilitam acordo julgado impossível

A Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, faz um discurso durante a LXV Cúpula do Mercosul em Montevidéu. O Mercosul e a União Europeia concluíram as 'negociações para um acordo de livre comércio

Ursula Leyen, presidente da UE, veio prestigiar o Mercosul

Jamil Chade
do UOL

Foram necessários uma guerra, uma ameaça protecionista, o avanço da extrema direita e um abalo geopolítico gerado pela China para um acordo quase impossível ser transformado em um pacto. O anúncio do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia aconteceu só por causa de eventos extraordinários, fora do controle dos blocos.

Se os europeus, por décadas, se recusaram a aceitar uma abertura mais ousada aos produtos do Mercosul, a guerra na Ucrânia mostrou a vulnerabilidade do abastecimento de alimentos do continente, mesmo ele sendo um importante produtor.

EFEITO TRUMP – Também foi fundamental o resultado da eleição nos EUA. Para os europeus, ficou evidenciado o risco do impacto que a vitória de Donald Trump poderia ter ao comércio mundial.

 O republicano já prometeu aplicar tarifas contra aliados, inclusive europeus, e sinalizou uma nova guerra comercial para privilegiar seus negócios e um protecionismo aguerrido.

Dentro da UE, os negociadores também consideraram que existe o risco real de que, num futuro próximo, a extrema direita chegue ao poder, com uma agenda nacionalista, que fecharia os espaços para um acordo.

PRESSÃO DA CHINA – A tudo isso se soma o desembarque da China como a maior potência comercial do mundo, algo que poucos poderiam imaginar quando a negociações entre o Mercosul e a UE foram lançadas.

Em Bruxelas, uma das armas para pressionar por um acordo foi alertar aos países do bloco que, sem esse pacto de livre comércio, não haveria jamais como voltar a concorrer com os produtos chineses.

Diante dessa transformação geopolítica, tanto os sul-americanos como os europeus cederam e aceitaram pontos antes considerados “inaceitáveis”.

EXEMPLO DA ONU – Grandes eventos mundiais, de fato, são responsáveis por iniciativas que, até então, poderiam ser consideradas impensáveis. Foi das cinzas de um Holocausto que surgiu uma utopia do tamanho da ONU. Foram duas guerras destruidoras que deram lugar ao maior projeto de paz dos últimos séculos: a UE, baseada na aliança entre os ex-inimigos França e Alemanha.

Em 2001, o lançamento das negociações para a Rodada Doha, na OMC (Organização Mundial do Comércio), foi um produto direto do sentimento de solidariedade que o mundo sentiu depois dos ataques terroristas de 11 de setembro. O projeto jamais seria concluído.

Eu estive em 1999, quando os presidentes Fernando Henrique Cardoso e Jacques Chirac anunciaram no Rio de Janeiro o início das conversas para o acordo Mercosul-UE. Alertaram, naquele momento, que seria um processo difícil. Mas jamais pensaram que duraria um quarto de século. O francês já morreu, vários dos embaixadores responsáveis pelo início daquela aventura já se aposentaram e outros também já morreram. Uma geração de negociadores passou pelos termos desse acordo.

TUDO DIFERENTE – Hoje, ele chega a uma conclusão num mundo radicalmente diferente, mais sombrio, e no qual o futuro precisa ser refeito.

Polêmico, o tratado não tem sua implementação assegurada. Para muitos, ele é ainda fruto de um mundo que acreditava que o livre comércio traria ganhos para todos. Os perdedores, hoje, mostram suas frustrações elegendo populistas, mentirosos, golpistas e a extrema direita.

SEGUNDA ETAPA – O anúncio do acordo é apenas uma etapa do processo. Mas um passo fundamental e histórico. Para que haja uma ratificação, o tratado passará pelo Conselho da Europa e pelo Parlamento Europeu. Serão batalhas épicas, de um lado e de outro.

Se o tratado for apenas mais um instrumento para beneficiar uma elite econômica de um ou outro lado do Atlântico, ele irá naufragar. Se o pacto conseguir distribuir renda, riqueza e sonhos, ele pode ser um marco.

A história dirá.

7 thoughts on “Guerra, Trump e China possibilitam acordo julgado impossível

  1. Como vejo esses movimentos, sabendo que existe uma “idéia fixa”, à qual todos alçado em qualquer parte do mundo tem como obrigação levar adiante como agenda! Sabedores que existem exemplos conhecidos de morticínio mundial e seus autores, conchue-se que à esses foi designado repetido papel como redutora populacional e então não existem diferenças de ideologias entre os tais arregimentados e “fraternos servos”!

  2. Europa chega atrasada no Mercosul, já dominado pela China

    União Europeia anuncia acordo com o Mercosul intempestivamente.

    China chegou antes e já se estabeleceu no mercado sul-americano.

    Só na última visita à Brasília, o colonizador Xi Jinping pois 37 ‘acordos’ na frente de Lula para ele assinar ‘sem contestar’, isso no dia 20 de novembro, em Brasília.

    E Lula, mesmo pego agora no contrapé (não sabia da decisão intempestiva da UE), sairá por aí anunciando que foi ele ‘o grande mentor’ do acordo Europa-Mercosul. Mas será só mais blábláblá.

    Sem se falar nos grandes negócios (como instalação de montadoras de veículos no país e construção de Porto no Peru), há ruas centrais em pequenas cidades no interior de São Paulo onde, de cada dez comércios, 6 ou 7 são chineses.

    Acorda, Brasil!

  3. Europa chega atrasada no Mercosul, já dominado pela China

    União Europeia anuncia acordo com o Mercosul intempestivamente, assustada com o avanço da China no continente sul-americano.

    China chegou antes e já se estabeleceu no mercado sul-americano.

    Só na última visita à Brasília, o colonizador Xi Jinping pois 37 ‘acordos’ na frente de um ‘colonizado’ Lula, para ele assinar ‘sem contestar’, no dia 20 de novembro, em Brasília.

    E Lula, mesmo pego agora no contrapé (não sabia da decisão intempestiva da UE), sairá por aí anunciando que foi ele ‘o grande mentor’ do acordo Europa-Mercosul. Mas será só mais blábláblá.

    Sem se falar nos grandes negócios (como instalação de montadoras de veículos no país e construção de Porto no Peru), há ruas centrais em pequenas cidades no interior de São Paulo onde, de cada dez comércios, 6 ou 7 são chineses.

    Acorda, Brasil!

  4. Desde 1999, Mercosul e União Europeia (UE) tentavam firmar um acordo de livre comércio entre os dois blocos.

    As tratativas entre o Mercosul e o bloco europeu começaram há 25 anos durante a Cimeira da América Latina, Caribe e EU, realizada no Rio de Janeiro, entre junho e julho de 1999, no governo de Fernando Henrique Cardoso.

    E nesta sexta-feira (06/12/2024), o acordo do Mercosul com a União Europeia enfim foi anunciado, em Montevidéu, capital do Uruguai, que sediou a Cúpula de Chefes de Estado do bloco.

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