Carlos Chagas
Em pleno Oriente Médio, pouco antes de embarcar de volta, o presidente Lula concedeu entrevista coletiva. O ponto era vago e, estimulados por empresários que integravam a comitiva, jornalistas brasileiros indagaram se caso eleita, Dilma Rousseff mudaria a política econômica. Se desenvolveria um programa estatizante.
O presidente deu duas no cravo e uma na ferradura. Declarou textualmente existirem três coisas “de que não abriremos mão”, uma espécie de confissão de que o governo Dilma irá desenvolver-se em condomínio no qual ele será o síndico: 1. Manutenção da estabilidade econômica; 2. Controle da inflação; 3. Investimentos públicos.
Os empresários sentiram-se no paraíso, aliás, no passado bíblico, localizado por ali. Ouviram a garantia de que nada vai mudar, reforçada pela afirmação de que “Dilma não será estatizante nem vai estatizar nada”.
O próximo passo parece à vista de todos: a ministra, antes ou depois de deixar o governo, divulgará sua versão pessoal da Carta aos Brasileiros assinada pelo Lula em 2002, tranqüilizando as elites. Fica a política econômica como está, ou seja, o país deve estar preparado para esquecer tudo o que for dito na campanha, se é que vão dizer alguma novidade.
E agira, Cabral?
Semanas atrás o governador Sérgio Cabral declarou que se Dilma Rousseff contrariasse os interesses do Rio, nem sua mulher votaria nela. A candidata não se pronunciou a respeito do projeto que muda o regime de royalties do petróleo, apesar de o senador Heráclito Fortes haver denunciado que o texto foi preparado na Casa Civil. Mas precisará posicionar-se, agora estimulada pela presença do presidente Lula em Brasília. A omissão não cabe, numa situação dessas.
O diabo é que se Dilma defender o projeto já aprovado na Câmara, nem poderá desembarcar no Rio e no Espírito Santo. Caso contrário, colherá a má-vontade dos estados esperançosos de receber recursos do petróleo que não produzem.
Por outro lado, fará o quê, o governador fluminense, caso se caracterize a garfada que o Congresso e o governo parecem estar em vias de aplicar no Rio e no Espírito Santo? Reforçará a proposta da candidatura própria no PMDB? Apoiará José Serra? Ou cruzará os braços, desinteressando-se da sucessão presidencial, iniciativa capaz de prejudicar-lhe a reeleição?
Não aguentou
Não se passaram duas semanas de silêncio do ex-presidente Fernando Henrique, depois de haver recebido recado de José Serra para não atrapalhar a estratégia sucessória dos tucanos. Em palestra na Academia Brasileira de Letras, convidado para homenagear a memória de Joaquim Nabuco, o sociólogo não aguentou. Disse que uma coisa é o candidato, outra a campanha. O PSDB deveria estar inundando o país com suas propostas de governo, mesmo permanecendo o governador paulista em cone de sombra. Como se fosse possível a existência de uma peça teatral sem autor.
Outra polêmica afirmação de Fernando Henrique disse respeito à política externa. Defendeu a volta ao alinhamento automático do Brasil com os Estados Unidos…
A dissolução da ordem pública
A Constituição admite a intervenção federal nos estados quando a ordem pública estiver em perigo. O Procurador Geral da República formalizou o pedido de intervenção federal em Brasília. O Supremo Tribunal Federal não tem prazo para decidir, mas já se debruça na questão.
Enquanto isso, o Distrito Federal vai se dissolvendo, com um governador-tampão posto em sossego e inação. Os apagões sucedem-se todas as semanas, não mais restritos a pequenas regiões, mas atingindo metade da cidade, ora num lado, ora em outro, por horas seguidas. Até a Praça dos Três Poderes e a Esplanada dos Ministérios ficaram sem energia.
Ao mesmo tempo, o trânsito virou um caos. Filas duplas no centro de Brasília são coisa do passado. Agora elas são triplas e até quádruplas. Os transportes coletivos nem transportam nem servem à coletividade, ficando os passageiros à mercê dos interesses dos concessionários de empresas de ônibus. Nas cidades satélites, virou aventura estar na rua depois do sol. Multiplicam-se os assaltos e as invasões de residências.
Com as instituições políticas locais sob suspeição, o ex-governador preso, os partidos em frangalhos e a possibilidade de as eleições de outubro reconduzirem ao poder o patrono de toda a lambança aqui verificada, não seria o caso da intervenção federal imediata?