Carlos Chagas
Falta aguardar as fotografias da noite de ontem, no Rio, porque nos flagrantes de sábado, em Recife, e de domingo, em Salvador, ficou clara a pobreza de espírito que começa a marcar a sucessão presidencial. Assistindo a passagem dos blocos pernambucanos e baianos em camarotes distintos, mas bem próximos, Dilma Rousseff e José Serra demonstraram como não se deve iniciar uma campanha. Desnudaram-se, no bom sentido, comparecendo aos destaques do Carnaval não porque fossem carnavalescos ou tradicionais adeptos dos festejos populares, mas, simplesmente, para aparecer e amealhar votos. Desengonçados até para sorrir e abanar para a multidão, imagine-se quando ensaiaram alguns passos de samba no mesmo lugar. Quer dizer, para ser eleitos, vale tudo, a começar pela demagogia. Viajaram para ver e ser vistos em constrangedoras aparições que pouca semelhança tiveram com a imagem de cada um. Porque Dilma sempre foi mulher de poucas expansões, conhecida pela rispidez de suas atuações administrativas. E Serra, sempre fechado e de poucas palavras, como explicar as forçadas efusões carnavalescas.
Melhor teriam feito a candidata e o candidato se tivessem permanecido em Brasília e em São Paulo, redigindo planos e programas ou reunindo-se com assessores de campanha. Ou até descansando. Cederam a travestidos e ingênuos conselhos de marqueteiros empenhados em fazer da sucessão um carnaval descabido. Contrariaram a natureza das coisas, uma péssima antecipação de como poderá, um deles no palácio do Planalto, continuar tentando fazer o mesmo.
Contradições
Verdadeira saraivada de exaltações à independência federativa seguiram-se à iniciativa do Procurador Geral da República, pedindo a intervenção federal em Brasília. Desde advogados de renome a ministros e ex-ministros de tribunais superiores, direta ou indiretamente começaram a pronunciar-se contra a medida. Tem azeitona nessa empada, porque do jeito que as coisas estão, reconhecem todos que seria abominável deixar o governo do Distrito Federal em mãos da quadrilha representada pelo Executivo e o Legislativo locais. Sem a intervenção, o governo passaria ao Tribunal de Justiça. É esse o objetivo dos que se opõem à drástica iniciativa? Proporcionar todo o poder ao Judiciário? E, de tabela, evitar que o presidente Lula se torne ainda mais forte, pois seria ele a designar o interventor?
Brasília está institucionalmente em frangalhos, mas interesses particulares, por mais legítimos que possam parecer, superam a causa pública. Porque para recuperar a dignidade da capital federal, só mesmo a intervenção, com o natural afastamento de todos os envolvidos na lambança recente. Até da Câmara Legislativa, com suas raras exceções.