Carlos Chagas
Mandou-se o presidente Lula para Trípoli, na Líbia, sob os ecos de seu veemente protesto contra a deposição do presidente Manoel Zalaya, de Honduras. Alegou que golpes militares e ditaduras não tem mais lugar na América Latina e que o Brasil não reconhece o novo governo daquele país.
Tudo bem, não fossem dois detalhes: para prestigiar os países da África, o nosso presidente esqueceu que a Líbia, há mais de trinta anos, é governada com mão de ferro pelo ditador Muhamar Kaddaffi, coronel que chegou ao poder através de um golpe militar e vem se “reelegendo” desde então. Da mesma forma, não foi completamente informado pelo Itamaraty de que a Suprema Corte e o Congresso, em Honduras, pronunciaram-se pela deposição do presidente Zalaya, sob a acusação de haver irregularmente marcado consulta popular para mudar a Constituição e permitir sua reeleição.
Em matéria de política externa, o Lula dá a impressão de marchar de passo errado. Ainda há dias sustentou a legitimidade da reeleição do presidente do Irã, quando boa parte da Europa e os Estados Unidos participam das denúncias sobre ter havido maracutaia no pleito, por sinal agora submetido a recontagem. Também não o alertaram de que deveria evitar encontro com o presidente da Rússia na cidade de Ekaterimburg, de triste memória. Lá, os comunistas trucidaram o csar Nicolau II e sua família.
Outro escorregão do primeiro-companheiro aconteceu meses atrás, quando, na Venezuela, defendeu com veemência o direito de Hugo Chavez mudar a Constituição para reeleger-se indefinidamente. Chegou a argumentar que a vontade do povo deveria prevalecer sobre as leis vigentes. Manifestação igual referiu-se a Evo Morales, da Bolívia.
Não deixa de ser irônico localizar a reeleição no âmago de cada uma das intervenções do Lula no campo da política externa. Porque na interna ele continua negando qualquer intenção de permanecer no governo depois de encerrado o seu segundo mandato.
Facilidades e dificuldades
Prepara-se a Câmara dos Deputados para votar, esta semana, modificações da lei eleitoral. Serão criadas facilidades para Suas Excelências disputarem a reeleição em 2010, como a liberação do uso da Internet nas campanhas e a estranha possibilidade de doações ocultas serem feitas aos partidos por pessoas físicas e jurídicas. O nome do doador permanecerá desconhecido e o candidato não estará vinculado a ele, cabendo aos partidos o papel de laranjas.
Admite-se, também, que nessa meia-sola eleitoral sejam reduzidos os prazos de desincompatibilização, bem como facilitadas as oportunidades para o troca-troca de legendas, beneficiando candidatos e eleitos.
No reverso da medalha, porém, dificuldades serão impostas ao cidadão comum. Seu voto só poderá ser digitado nos computadores caso apresente, junto com o título de eleitor, outro documento contendo sua fotografia atualizada. Convenhamos, o tempo passa mas não muda nada em termos de facilidades para quem legisla…
Propriedade privada
Observadores dedicaram parte de seu tempo, no fim de semana e ontem, indagando-se porque José Serra decidiu abandonar a postura cautelosa e pacífica de evitar confrontos com o governo federal e seus aliados. Porque na sexta-feira o governador paulista vibrou tacape e borduna no lombo do PT. Declarou publicamente que o partido do presidente Lula usa o governo como se fosse propriedade privada.
Acima e além de saber que a acusação é verdadeira, desperta a atenção conhecer seus motivos. Será porque a candidatura Dilma Rousseff vem crescendo nas pesquisas eleitorais? Ou porque a maioria dos tucanos entende chegada a hora de mais agressividade por parte de seu candidato? No fim dá no mesmo, restando saber se o diagnóstico de Serra constituiu um desabafo isolado ou se marca o início de uma nova fase na campanha presidencial.
Porque quanto ao PT ter ocupado a administração federal, nem haverá que duvidar. Bastaria relacionar o número de petistas que integram as diretorias do Banco do Brasil, da Petrobrás e de outras empresas públicas, para não falar nos 36 mil cargos em comissão ocupados por eles no país inteiro. Ou nas centenas de ONGs criadas com dinheiro público e dirigidas por companheiros.
Por que Brasília?
Quem acompanha o noticiário dos jornais, revistas, tele e rádio-jornais, acostumou-se a ouvir montes de vezes por dia referências aos escândalos de Brasília, agora atingindo o Senado, como antes a Câmara, nos tempos do mensalão e outros. Marcam a cidade como geradora da roubalheira.
Seria bom lembrar que os patrocinadores e os beneficiários dessas sucessivas maracutaias, sejam parlamentares, sejam altos funcionários, provém das mais diferentes regiões do país. Boa parte chega na terça e volta na quinta-feira. Acusar a capital federal de covil ou escola de bandidos é injustiça para com a população local. Aqui se trabalha, e muito. Os ladrões vem de fora, exceção de uns poucos que resolveram seguir os maus exemplos.