“Um povo corrompido não pode tolerar um governo que não seja corrupto”

O desafio de reduzir a corrupção no Brasil | Tema de Redação - Temas de redação | coRedação

Charge do Duke (O Tempo)

Mário Sabino
Metrópoles

Os brasileiros não estão nem aí para o problema da corrupção. Mas não é porque você ignora o problema que o problema deixa de existir. Ao contrário, ele tende a aumentar ao ser ignorado, o que é ótimo só para o corrupto, apesar de dizerem que certa dose de corrupção faz bem, é até vitamina para o crescimento econômico, patati patatá.

A Petrobras, por exemplo, foco do maior escândalo de corrupção da história brasileira e quiçá mundial, voltará a ter políticos e sindicalistas em cargas de direção. Reabre-se a avenida para a gatunagem, de onde se concluiu que o único remédio para impedir que a empresa seja o parque de diversões dos corruptos seria privatizar completamente a joça toda — o que não vai acontecer nunca.

COISA CHATA – Com o desmonte da Lava Jato, denunciante corrupção virou coisa de gente messiânica, chata e até golpista. O discurso de que a operação foi ação orquestrada para aniquilar Lula e o PT colou tanto, parabéns aos spin doctor, que passou a ser repetido sem qualquer sombra de vergonha em salas de aula. Militantes disfarçados de professores ensinam essa mentira aos alunos ignaros como se fosse dado histórico indiscutível.

Posso ter perdido algo, mas aqui nas adjacências não vi ninguém dar muita bola para o relatório sobre o Brasil, divulgado pelo Grupo de Trabalho Antissuborno da OCDE, há duas semanas. É uma tomografia dos retrocessos encorajados nas diversas instâncias do poder para desmanchar o que foi feito em prol da transparência e da honestidade no trato da coisa pública.

Entre os retrocessos, o fim da prisão em segunda instância, o desmonte das forças-tarefas e a anulação dos acordos de leniência.

FAKE NEWS – Em outras freguesias, os suspeitos de fantasia destacaram uma referência rápida à politização da Lava Jato, dando a entender que a operação havia sido condenada até o último grau pelos autores do relatório.

Menos rápida, na verdade, é uma referência às retaliações que os procuradores da Lava Jato sofreram no TCU, aquele monumento à independência funcional, por terem ousado combater a corrupção nas altas esferas.

Ao longo do relatório, a verdade documentada com números é que a operação parece responsável por ter elevado o grau de excelência no combate à corrupção dentro e fora do país.

AUTOCENSURA – O Grupo de Trabalho Antissuborno da OCDE também aborda como a autocensura entrou para o cotidiano do jornalismo investigativo brasileiro, em consequência dos ataques bolsonaristas (mas não só dos bolsonaristas, presume-se) e do fim da Lava Jato:

“Embora exista liberdade de imprensa no Brasil (mais em nível nacional do que regional), os repetidos ataques contra a mídia nos últimos anos tiveram um efeito inibidor sobre a profissão”, diz o relatório acrescentando:

“Na opinião (de jornalistas), esses ataques, combinados com a incerteza geral sobre o compromisso do Brasil no combate à corrupção após o desmantelamento das forças-tarefas da Lava Jato, desenvolveram para um aumento do nível de autocensura na profissão.”

DOU MEU EXEMPLO – Eu já disse, sem qualquer originalidade, que a autocensura é a pior forma de censura. Exemplo: estava para comentar o que registra o relatório da OCDE sobre a atuação de um ministro de corte superior, mas, diante da liberdade de imprensa em vigor, decidiu autocensurar-me.

Os brasileiros não estão nem aí para o problema da corrupção. Aquilo que se viu entre 2015 e 2018 foi momento singular do qual não há plural. Compreendo perfeitamente: “um povo prejudicado não pode tolerar um governo que não seja corrupto”.

A máxima é do Marquês de Maricá, aquele pândego. Máxima de um país mínimo (não estou, não, roubando o título do livro de certo jornalista, porque fui eu a sugerir o título a ele). O brasileiro é bom companheiro, ninguém pode negar.

###
PS –
Lula avisou que não vai cumprir a meta fiscal prometida por seu ministro da Economia para o ano que vem. É a corrupção da palavra. (EM)

6 thoughts on ““Um povo corrompido não pode tolerar um governo que não seja corrupto”

  1. Corrupção é um processo que vem de longe proveniente da falta de educação e caráter, e não é privilégio de classes ou categorias

    A “Petrobrás voltará a ter políticos e sindicalista na direção. Reabre-se a avenida para gatunagem”, diz o articulistas, como se todos políticos e sindicalistas fossem corruptos e todos não sindicalistas nem políticos fossem honestos. É bom lembrar que no petrolão tinham funcionários de carreira envolvidos em corrupção.
    Privatizar a joça toda é a solução para acabar com a corrupção.
    A diferença é, contra a corrupção tem a justiça, mas nada contra o enriquecimento dos acionistas da Petrobrás que tem a maioria de acionista estrangeiro, pois está dentro da Lei das Estatais.

    A Petrobrás, assim como as demais empresas de base estratégicas foram criadas para ajudar o desenvolvimento do país e isso veio acontecendo, ainda que com alguns erros.

    A venda da Petrobrás certamente seria para as grandes indústrias multinacionais de petróleo, em que o lucro seria para o enriquecimento da matriz as custas dos preços caros cobrados aqui no Brasil.
    A iniciativa privada não tem compromisso como social, seu compromisso é o Lucro.

    Vende tudo, é a campanha da direita deletéria que não tem noção do que é uma nação.
    .

  2. Não sei quem é esse articulista do artigo, mas com certeza é daqueles que tentam impingir aos incautos coisas como se fossem verdades (só se forem verdades para ele).

    Com qual objetivo? Com aquele velho discurso que a maior de nossas mazelas é a corrupção material. Aí fala em privatizar, como isso fora a panaceia. Esquece o cidadão que nas empresas privadas, também existe corrupção. Ou a sonegação, a procrastinação de pagamentos de dívidas não são uma forma de corrupção? Só ver o caso das Americanas. Seria essa empresa estatal?

    Fala que quase ninguém cita o relatório da OCDE. Mas será que ele leu ou entendeu? Acho que não, pois tece comentários nada a ver. Esse relatório foca no suborno internacional, coisa que ele parece desconhecer. Também acompanha as recomendações feitas pelo grupo. Algumas já implementadas, outras não.

    Enfim, o autor não escreve que uma das recomendações do relatório é a proteção de pessoas que denunciam subornos nas empresas da iniciativa privada, já que para os setores públicos parece que a proteção funciona.

    Quanto à mídia, o relatório cita que na administração anterior houve ataques à imprensa que inibiram os jornalistas.

    Enfim, o autor não fala na mãe de todas as corrupções: a corrupção moral.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *