Frédéric Mousseau e Eve Devillers
Site Resistir
Desde a invasão russa em fevereiro de 2022, a guerra na Ucrânia tem estado no centro das atenções da política externa e da mídia. No entanto, pouca atenção tem sido dada a uma grande questão que está no centro do conflito: quem controla as terras agrícolas no país conhecido como “o celeiro da Europa”?
Preenche-se esta lacuna identificando os interesses que controlam as terras agrícolas ucranianas e apresentando uma análise das dinâmicas que atuam em torno do regime fundiário no país. Isto inclui a reforma agrária altamente controversa que teve lugar em 2021 como parte do programa de ajustamento estrutural lançado sob os auspícios das instituições financeiras ocidentais, após a instalação de um governo pró-União Europeia (UE) na sequência da revolução Maidan em 2014.
NOVOS OLIGARCAS – Com 33 milhões de hectares aráveis, a Ucrânia possui algumas das terras agrícolas mais férteis do mundo. Desde o início da década de 1990, privatizações mal orientadas e uma governação corrupta concentraram as terras nas mãos de uma nova classe oligárquica.
Cerca de 4,3 milhões de hectares estão afetados à agricultura industrial, a maior parte dos quais, ou seja, três milhões de hectares, nas mãos de uma dúzia de grandes empresas agroalimentares. Além disso, segundo o governo, cerca de cinco milhões de hectares – o tamanho de duas Crimeias – foram “roubados” ao Estado ucraniano por interesses privados.
A área total de terras controladas por oligarcas, indivíduos corruptos e grandes empresas agroindustriais eleva-se, em consequência, a mais de nove milhões de hectares, ou seja, mais de 28% das terras aráveis do país. O resto é utilizado por mais de oito milhões de agricultores ucranianos.
EMPRESAS ABUTRES – Aqueles que hoje controlam as terras ucranianas são uma mistura de oligarcas e interesses estrangeiros diversos – principalmente europeus e norte-americanos, inclusive um fundo de investimento privado com sede nos EUA e o fundo soberano da Arábia Saudita.
Com exceção de uma, as dez empresas que controlam a maior parte das terras estão registadas no estrangeiro, sobretudo em paraísos fiscais como Chipre ou Luxemburgo. Mesmo quando são geridas e ainda largamente controladas por um oligarca fundador, algumas destas empresas entraram em bolsa, com bancos e fundos de investimento ocidentais a controlarem desde então uma proporção significativa das suas ações.
Existem numerosos investidores importantes, nomeadamente o Grupo Vanguard, Kopernic Global Investors, BNP Asset Management Holding, NN Investment Partners Holdings (uma filial da Goldman Sachs) e Norges Bank Investment Management, que gere o fundo soberano da Noruega.
OUTROS DONOS – Vários grandes fundos de pensões, fundações e fundos de dotações universitárias dos EUA também investiram em terras ucranianas por intermédio da NCH Capital, um fundo privado com sede nos EUA que é o quinto detentor fundiário da Ucrânia.
A maior parte destas empresas estão endividadas junto a instituições financeiras ocidentais, em especial o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BERD), o Banco Europeu de Investimento (BEI) e a Sociedade Financeira Internacional (SFI) – o ramo do Banco Mundial dedicado ao sector privado.
Em conjunto, estas instituições têm sido financiadores importantes do setor agroindustrial na Ucrânia, com quase 1,7 mil milhões de dólares emprestados a apenas seis das maiores empresas agro-industriais nos últimos anos.
DÍVIDA AMEAÇADORA – Outros grandes credores são uma mistura de instituições financeiras, sobretudo europeias e norte-americanas, tanto públicas como privadas. Esta dívida não só dá aos credores uma participação financeira nos resultados das empresas agro-alimentares, como também lhes confere um efeito de alavancagem significativo.
A reestruturação da dívida da UkrLandFarming, uma das sociedades que detém mais terras na Ucrânia, é prova disso. Envolveu credores como as agências públicas de importação e exportação dos Estados Unidos, Canadá e Dinamarca, entre outros, e levou a grandes mudanças organizacionais, incluindo demissão de milhares de trabalhadores.
FAVORECIMENTOS – Este financiamento internacional beneficia diretamente os oligarcas, vários dos quais foram acusados de fraude e corrupção, bem como fundos estrangeiros e empresas associadas como acionistas ou credores.
Durante este tempo, os agricultores ucranianos têm de trabalhar com terras e financiamentos limitados, muitos dos quais se encontram atualmente no limiar da pobreza. Os dados mostram que estes agricultores não recebem praticamente qualquer apoio do agronegócio e dos oligarcas.
O Fundo de Garantia Parcial de Crédito criado pelo Banco Mundial para apoiar os pequenos agricultores ascende a apenas 5,4 milhões de dólares, um montante insignificante em comparação com os milhares de milhões atribuídos às grandes corporações do agronegócio.
AJUDA EXTERNA – Nos últimos anos, os países ocidentais e as suas instituições têm prestado uma assistência militar e económica maciça à Ucrânia, que se tornou o maior beneficiário da ajuda externa dos EUA – é a primeira vez desde o Plano Marshall que um país europeu ocupa esta posição de topo.
Em dezembro de 2022, menos de um ano após o início da guerra, os EUA concederam mais de 113 mil milhões de dólares à Ucrânia, incluindo 65 mil milhões de dólares em ajuda militar, ou seja, mais do que o orçamento total do Departamento de Estado e da USAID (58 mil milhões de dólares).
A ajuda ocidental está condicionada a um drástico programa de ajustamento estrutural, que inclui medidas de austeridade, cortes nas redes de segurança social e a privatização de sectores-chave da economia. Uma das condições essenciais foi a criação de um mercado fundiário, introduzido em 2020 pelo Presidente Zelenskyy, apesar da oposição da maioria dos ucranianos temerosos de que isto exacerbasse a corrupção no sector agrícola e reforçasse o seu controlo por interesses poderosos.
DÍVIDA SEM CONTROLE – Estas inquietações são exacerbadas pela dívida externa vertiginosa e crescente da Ucrânia, contraída em prejuízo das condições de vida da população devido às medidas impostas pelo programa de ajustamento estrutural.
O fim da guerra deveria ser o momento e a oportunidade para fazer exatamente o contrário, ou seja, redefinir um modelo económico que não fosse mais dominado pela oligarquia e pela corrupção, mas em que a terra e os recursos fossem controlados por e para os ucranianos. Isto poderia constituir a base para transformar o setor agrícola, tornando-o mais democrático e sustentável económica e socialmente.
A política internacional e o apoio financeiro devem ser orientados para esta transformação, a fim de beneficiar as pessoas e os agricultores ao invés dos oligarcas e dos interesses financeiros estrangeiros.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Excelente artigo, enviado por José Guilherme Schossland. Mostra que por trás de toda guerra sempre existem poderosos interesses econômicos. E as minas e bombas estão destruindo o celeiro da Europa. A quem interessa isso? Certamente, interessa ao maior exportador agrícola de mundo, a matriz USA, e à sua filial Brazil… (C.N.)
A preocupação com o futuro da Ucrânia vale também para a Rússia? Ela sofre dos mesmos defeitos da ucraniana, a corrupção endêmica, que perpassa a ditadura russa é até até pior e maior. É muito fácil jogar pedra na Ucrânia, no momento ela está levando a pior, mas quando o rumo da guerra mudar, já se perguntaram o que vai ser o destino da Rússia? A agricultura soviética não conta com a ajuda ocidental, ou seja, …..
“Patrões” dos “alçados”, dos “eventos”, das ditaduras, guerras e revoluções e do “Barba & Multilaterais Asseclas” em:
https://www.facebook.com/share/p/ucMsrhV3ZuGLYZci/?mibextid=oFDknk
Recordar é viver…
Por volta do ano 2021,o nosso editor queria expurgar o nosso comentarista barriga verde.
Fiz um apelo ao editor CN,conviver com as diferenças,ainda mais,se tratando do senhor SCHOSSLAND,homem inteligentíssimo e uma bagagem cultural elevada.
Parabéns Schossland,pela tradução…
Abraço desse provinciano.
LFS…
Abraço à voce LFS e digo que me exponho acreditando ser minha missão despertar quem estatutariamente enlaçado, pensa saber tudo em insensível detrimento de seus tidos desassemelhados!
Sabe de nada inocente, acha que o conflito na Ucrânia de OTAN X Rússia é por causa de terra fértil? Tem vários motivos, mas terra fértil esta no final da lista. O conflito aconteceu antes de 2014, com Euromaidan e o golpe de estado que a Ucrânia sofreu. Uma pena que a guerra poderia ter sido evitada, mas Boris Johnson foi porta-vos do Biden e convenceu Zelensky a não fazer acordo com a Rússia. Boris Johnson vendeu a ilusão que a OTAN entraria no conflito de corpo e alma caso a Rússia atacasse a Ucrânia.
A guerra aconteceu principalmente por motivos econômicos. EUA e OTAN achavam que a Russia iria quebrar com a guerra. A Rússia invadiu a Ucrânia pois não queria a OTAN na sua porta e com a Ucrânia sendo membro da OTAN, o próximo passo seria um novo conflito por causa da Criméia.
Por que não falou da economia da Europa e o ataque terrorista de Nord Stream ? Alemanha está pagando 3 vezes mais pelo gás que antes comprada dos russos, advinha quem está lucrando horrores com essa guerra? Europa usando todo o seu estoque de armas na guerra, advinha que vai vender muitas armas?
Teremos novos conflitos, principalmente depois das eleições americanas, o mundo está se armando até os dentes.
Claudio,VC apontou o motivo principal,”ECONÔMICO”.
A Ucrânia, além das terras férteis(econômico),tem para oferecer ao mundo ?..
A Ucrânia foi usada pelo ocidente para desgastar a Rússia. Victoria Nuland participou ativamente do golpe de estado na Ucrânia e desde 2014 o país vem sendo preparado para uma guerra com a Rússia. Inclusive instalaram fábricas de armas biológicas para isso.
https://www.youtube.com/watch?v=ydSf57SRtcQ
A Rússia invadiu a Ucrânia por uma questão estratégica. O que os EUA fariam se a Rússia instalasse mísseis em Cuba ou no México? A Ucrânia influenciada pelos EUA e OTAN optaram por não negociar, acharam que as forças russas eram sucateadas e a Rússia iria quebrar em poucos meses.
O sonho americano e transformar a Rússia em 17 nações, isso quase aconteceu com a política neoliberal de Gorbatchov e Putin conseguiu reerguer a Rússia colocando o país no cenário mundial novamente. A Rússia não queria a guerra, mas se preparou muito bem para ela, hoje a indústria bélica fabrica 3 vezes mais armas que os EUA e OTAN juntos. Já o ocidente queria e guerra e não se preparou para ela, a Ucrânia possuía o melhor exército da Europa, se continuassem com a preparação, em poucos anos teriam condições de enfrentar a Rússia e recuperar a Criméia. Claro que nem todos os países ocidentais estão perdendo com isso. Os EUA passaram a controlar o mercado enérgico da Europa, o ataque a Nord Stream mostrou bem isso. Sem energia barata, a Europa perde a competividade, e os EUA fazem a latinização na Europa pois hoje o mundo não comporta três grandes potências industriais (EUA, China e Europa). Os EUA precisam de fôlego para se contrapor com a China e nada melhor do que sucatear a Europa. Isso sem contar com todas as armas que a Europa está enviando para a Ucrânia, os países precisaram refazer seus defesas e eles irão comprar as armas de quem?
Essa guerra na Ucrânia tem muitos motivos, mas terras férteis estão no final da lista. Nações usam vidas humanas como peças de xadrez. A Ucrânia acabou como nação, é muito provável que irá perder mais territórios para outras nações como Polônia e Roménia com o intuito de proteger parte do seu povo pois a criação da Ucrania levou parte do território desses países.
O mundo hoje está se armando, China em 6 anos terá uma frota naval 50% maior que a dos EUA. Hoje o cenário geopolítico mudou com novos players como Irã e Coreia do Norte. A Turquia possui o maior exército da Europa e pensa em deixar a OTAN. A Argélia é pró Rússia e possui um contingente militar maior que qualquer país europeu. Isso sem falar na Índia que está surgindo como nova força econômico-militar no mundo. Acredito que essa guerra na Ucrânia é só o começo dos conflitos, teremos mais após as eleições americanas.
Pois é , com essa aventura do golpe de estado na Ucrânia e posterior ascensão de Zelensk ao poder , foi assinada a pena de morte da Ucrânia e da economia da união europeia , sendo que agora estão forçando uma guerra total contra a Rússia , para mascarar e justificar a decadência econômica Europeia , que caíram na esparrela de financiar a guerra a mando dos USA , uma potência visivelmente decadente , que usa as guerras para se manterem á tona , mas é perca de tempo .