Se prever o presente já é difícil, imaginem prever o futuro…

Charge do Jean Galvão

Marcus André Melo
Folha

Dante, em “A Divina Comédia”, colocou os adivinhadores no Oitavo Círculo do Inferno, com a cabeça torcida, voltada para as costas, com as lágrimas molhando as nádegas, de maneira que não conseguem olhar para a frente. Essa é a punição por alegarem saber o futuro que estaria ao alcance apenas de Deus.

“Predição é muito difícil. Especialmente se for sobre o futuro”, a frase é de um dos criadores da física quântica, Niels Bohr.

PRESENTE E FUTURO – Estimar um modelo com base em um conjunto de dados/variáveis do passado é uma coisa. É como prever o presente. Mas prever resultados futuros (“out of sample”) é muito mais complexo, exigindo suposições sobre o papel de fatores ainda desconhecidos. Muitas previsões são muito complexas; outras simplesmente impossíveis.

Previsões por cientista políticos e economistas têm algo em comum: estão ancoradas em expectativas sobre expectativas.

A metáfora de Keynes sobre um hipotético concurso cujos participantes deveriam escolher —com base nas fotografias de centenas de candidato(a)s— os mais atraentes, e serem premiados pela previsão correta quanto ao vencedor é clássica; ela permite uma distinção entre a preferência do analista e a dos demais, cuja agregação determinará o resultado final.

POLARIZAÇÃO – Apostar no que desejamos que aconteça é fonte permanente de autoengano. Mas é o mais comum. No contexto atual da polarização as predições confundem-se com torcida partidária e politicamente tribal.

A metáfora captura outra distinção: não se trata apenas da opinião pura e simples doS participantes, mas da percepção que têm sobre a avaliação que a média das pessoas farão.

A premiação é para quem acertar o vencedor, e todos farão o cálculo com base em expectativas do conjunto de participantes. A analogia aqui é com a bolsa: o que um indivíduo pensa sobre o valor de uma ação não importa, mas, sim, o que os demais pensam a respeito; ou mais importante, que previsões fazem sobre a avaliação média do mercado sobre a ação.

E A ELEIÇÃO? – O mesmo vale para o voto. Tanto o comparecimento quando o voto em si são função de expectativas sobre os resultados eleitorais.

Fenômenos de enorme importância política, como a Primavera Árabe, a queda do Muro de Berlim e a eleição de Trump, não foram antecipados por nenhum analista. Muitos destes eventos raros (no jargão, a “cauda longa”) caracterizam-se por processos que se aceleram e eclodem subitamente.

Timur Kuran identificou “cascatas informacionais” que deflagram efeitos manadas e que não são observáveis pelos analistas por que os atores sociais falsificam suas preferências.

AS PREVISÕES – De repente milhões de apoiadores de uma causa aparecem do nada. Ou se recusam a responder a pesquisas de opinião, introduzindo vieses.

Fazer previsões oscila entre hubris e charlatanismo, mas elas são inevitáveis e devem ser vistas como chutes fundamentados.

No Oitavo Círculo, os Adivinhos têm por companhia Sedutores, Aduladores, Simoníacos, Corruptos, Hipócritas, Ladrões do sagrado, Maus conselheiros, Semeadores da discórdia, Alquimistas. Muitos deles Dante Alighieri identifica pelo nome: são personagens reais da política fiorentina e da história. Penso em quão longa seria a lista dos personagens da nossa divina comédia cotidiana.

Internação de Lula expõe fragilidades e anomalias nas relações de poder

Ton Molina/Getty Images

Alckmin é um vice-presidente que jamais assume

Bruno Boghossian
Folha

A cirurgia que deve tirar Lula de campo até a próxima semana exibe sintomas agudos de deformações conhecidas do governo e das relações de poder no país. A internação do presidente não oferece um grande risco político imediato, mas expõe anomalias institucionais e fragilidades domésticas da gestão petista.

A concentração da autoridade política nas mãos de Lula é a marca mais cantada deste mandato. Não é uma grande deformação para os padrões do presidencialismo brasileiro, mas essa característica condicionou toda a estrutura do poder a uma dependência acentuada da porta para dentro e da porta para fora.

GASTOS PÚBLICOS – A coincidência da internação com a corrida acelerada para a aprovação do ajuste fiscal mostra o quanto Lula precisa de Lula. Ainda que o presidente esteja disposto a despachar do hospital, o momento politicamente delicado é um lembrete de que parte da influência do petista está ancorada em seus gestos públicos e conversas reservadas em Brasília.

Nenhum ministro de Lula teve disposição ou força para adoçar o remédio amargo da contenção de gastos em dois setores cruciais para a deglutição do pacote: a base social do governo e o PT.

Até aqui, o presidente não puxou para seu colo o desgaste das medidas, mas auxiliares avaliavam que só ele teria condições de cumprir a missão. No hospital, seu alcance fica limitado por alguns dias.

DISTORÇÃO NÍTIDA – Dentro dos palácios, a distorção é ainda mais nítida. Horas antes da internação, o próprio Lula precisou endossar um acordo de liberação de emendas para tentar destravar a votação do pacote num Congresso que nunca considerou suficiente a palavra de ministros destacados pelo petista.

A aberração política aparece na forma de uma chantagem que só funciona quando é apresentada diretamente ao presidente.

O tamanho dos eventuais prejuízos da ausência parcial de Lula ainda será medido. Os possíveis efeitos de curto prazo na operação política do governo, porém, são mais palpáveis do que as precoces especulações sobre 2026 e a sucessão do petista. Considerada a previsão dos médicos de uma boa recuperação, tudo indica que essa questão também dependerá mais do próprio Lula do que de outros personagens.

Juíza condena Caiado por usar ‘palavras mágicas’ para pedir votos

Caiado fez o possível e o impossível para eleger Mabel

Juliano Galisi
Estadão

A decisão da Justiça Eleitoral de Goiás que condenou Ronaldo Caiado (União Brasil) a oito anos de inelegibilidade mais multa por abuso de poder político afirma que o governador usou “palavras mágicas” para pedir votos a Sandro Mabel (União Brasil), seu candidato à prefeitura de Goiânia. A sentença desta segunda-feira, 9, também cassa a chapa eleita na capital goiana.

De acordo com a juíza Maria Umbelina Zorzetti, da 1ª Zona Eleitoral de Goiânia, Caiado usou o Palácio das Esmeraldas, sede do governo do Estado, para realizar eventos de campanha para Mabel, pressionando os presentes a pedirem votos em seus redutos eleitorais para o candidato do União Brasil.

ABUSO DE PODER – A prática, para a juíza, configura abuso de poder político e é vedada pela legislação eleitoral.

Para configurar a prática de pedido de voto, a juíza citou uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre o uso de “palavras mágicas”, como são chamadas expressões típicas para pedido de voto. A magistrada destacou que, segundo a lei eleitoral, “o pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução ‘vote em’, podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo”.

Os jantares denunciados ocorreram nos dias 7 e 9 de outubro, no início do segundo turno do pleito, e contaram com a presença de vereadores eleitos, suplentes e lideranças políticas de Goiânia.

PALAVRAS MÁGICAS – Em um desses encontros, Caiado discursou aos presentes. “Vocês não estão aqui como pessoa física não, vocês estão aqui como líderes que vocês são e vocês colocaram seus nomes para disputar uma eleição municipal! Então se vista desta credencial e volte com muita humildade”, disse o governador.

Em seguida, o mandatário passou a exemplificar como os presentes deveriam se dirigir às suas bases eleitorais para apoiar Mabel. A juíza destacou o trecho a seguir como um pedido explícito de votos:

“Olha, agradecer o voto. Não fui eleito, mas você pode saber que eu continuarei na luta política porque, eu ao ter o Sandro Mabel lá na prefeitura, eu tenho acesso para resolver os problemas da minha região e ele vai resolver porque tem o apoio do governador Ronaldo Caiado”.

EM BUSCA DO SONHO – Mabel, segundo a juíza, também realizou pedido de votos com “palavras mágicas” – mesmo não tendo dito, explicitamente, “vote em mim”.

“A esperança que eu tenho com vocês é que eu quero dizer pra vocês que o sonho não terminou”, disse Mabel em um dos encontros. “Junto com vocês nós vamos construir a melhor capital do Brasil”, afirmou o candidato em outro momento.

Cabe recurso ao Tribunal Regional Eleitoral de Goiás e, depois, ao TSE. Se confirmada, a decisão impede os planos eleitorais do governador, que está no segundo mandato à frente do Executivo goiano e já se lançou como pré-candidato à Presidência nas eleições de 2026.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
“Eu respeito a decisão da Justiça e a matéria será julgada em instâncias superiores. Meus advogados já apresentaram recurso e essa matéria será revista”, afirmou o governador, alegando que os eventos no Palácio das Esmeraldas foram para tratar sobre crise em diversos setores da Prefeitura de Goiânia. A alegação é do tipo “me engana que eu gosto”, como dizia Carlos Chagas. (C.N.)

Anielle tenta se equilibrar entre pressão interna e críticas externas

Mulheres negras se reconhecem na dor”, diz Anielle Franco | Metrópoles

Anielle não quis comentar a absolvição de Silvio Almeida

Jennifer Gularte
O Globo

Três meses após as denúncias de assédio sexual que derrubaram o ex-ministro de Direitos Humanos Silvio Almeida, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, uma das vítimas, tenta se equilibrar entre pressões internas pela exposição do caso e críticas de setores da comunidade negra, que apontam descaso com políticas públicas voltadas para o segmento.

A estratégia da ministra tem sido intensificar anúncios da pasta e se aproximar do núcleo duro do governo.

CRISE NA GESTÃO – O episódio envolvendo os dois ministros de Lula abriu uma crise na gestão petista. Antes de as denúncias serem reveladas, os relatos sobre a conduta de Almeida já circulavam no Planalto há pelo menos um ano, o que gerou especulações sobre suposta tentativa de abafar o caso.

Após a demissão, contudo, Anielle agiu para blindar o presidente e colegas de Esplanada.

Em entrevista ao GLOBO, em outubro, afirmou que nunca havia conversado com ninguém do governo sobre o assunto e que Lula só soube quando a imprensa noticiou.

DESAFIO MAIOR – O entorno da ministra considera que sua missão no governo ficou ainda mais desafiadora após a revelação do caso. Anielle tem se mobilizado para superar o episódio e dar visibilidade aos temas do ministério.

Até mesmo com pessoas próximas, a ministra afirma não querer tratar do que aconteceu para focar em assuntos da pasta. Procurada pela reportagem, ela não quis comentar. Almeida também não quis falar.

Além de sua relação de amizade com a primeira-dama, Rosângela Silva, a Janja, Anielle tem sido prestigiada por Lula em eventos públicos, em demonstrações de apoio. O último deles ocorreu há dez dias, quando ela esteve ao lado do presidente, no Palácio do Planalto, para a assinatura da titulação de 15 territórios quilombolas.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Matéria de um lado só não é jornalismo. A verdade é o contrário. Lula está por aqui com Anielle, porque demitiu o ministro e ele foi inocentado na investigação feita pela Comissão de Ética da Presidência da República. No mês passado, Lula não quis nem participar da cerimônia do Dia da Consciência Negra, organizada por Anielle. (C.N.)

Com dor de cabeça e sonolência por dias, Lula ignorou alerta médico

Lula estava sonolento e com forte dor de cabeça antes da cirurgia | Metrópoles

Lula estava mal, mas não chamou os médicos do Planalto

Thais Bilenky
do UOL

O presidente Lula contou a interlocutores que sentiu sonolência durante uma semana e dor de cabeça forte por quatro dias antes de se submeter a exames, com isso o sangramento chegou a 3 cm de diâmetro, pressionando seu cérebro.

Os dois sintomas tinham sido apontados por sua equipe médica como indicativos de alerta. Caso os sentisse, deveria tomar providências imediatas.

O presidente, no entanto, foi levando. E ainda adiou a tomografia que faria no sábado (7) em São Paulo, já que estaria na capital paulista na data.

AGRAVAMENTO – A situação se agravou ao longo da segunda-feira (9). A dor se intensificou e, à tarde, ele estava visivelmente pior do que de manhã. Foi então que, examinado pela médica que o acompanha no dia a dia, foi para o Hospital Sírio-Libanês, em Brasília.

A tomografia identificou uma hemorragia intracraniana, e a equipe médica decidiu transferi-lo para São Paulo para submetê-lo a uma cirurgia às pressas.

O sangramento é decorrente de um acidente doméstico que Lula sofreu em 19 outubro. Ele estava sentado em um banco, cortando as unhas do pé no banheiro, quando se desestabilizou, caiu no chão e bateu a cabeça, no Palácio do Alvorada.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Esta médica do Planalto deveria ser demitida imediatamente. Com um paciente já idoso, que já teve câncer e outras doenças, era obrigação dela atender Lula diariamente, perguntar se estava sentindo alguma coisa. Com sua preguiça e leniência, a médica fez com que o quadro de Lula se agravasse bastante, sem necessidade. Em suma, é um governo em que nada funciona. (C.N.)

A extraordinária romaria de Renato Teixeira, que emocionou o país

RomariaPaulo Peres
Poemas & Canções

O cantor e compositor paulista Renato Teixeira de Oliveira, um dos mais destacados cantores da música regionalista, na letra de “Romaria” expressa o desejo por dias melhores, de fartura, povoando a mente do fervoroso homem do campo, que com fé luta contra as adversidades de sua dura e solitária rotina. 

A música “Romaria” foi gravada por Elis Regina no LP Elis, em 1977, pela Philips, tornando-se rapidamente sucesso em todo o país.

ROMARIA
Renato Teixeira

E de sonho e de pó
O destino de um só
feito eu perdido em pensamentos
sobre o meu cavalo
É de laço e de nó
De gibeira ou jiló
dessa vida cumprida a só

Sou caipira pirapora nossa
Senhora de Aparecida
Que ilumina a mina escura
e funda o trem da minha vida

O meu pai foi peão
Minha mãe solidão
meus irmãos perderam-se na vida
a custa de aventuras
Descasei, joguei
investi, desisti
Se há sorte eu não sei nunca vi.

Sou caipira pirapora nossa
Senhora de Aparecida
Que ilumina a mina escura
e funda o trem da minha vida

Me disseram porém
que eu viesse aqui
pra pedir em romaria e prece
Paz nos desaventos
Como não sei rezar
Só queria mostrar
Meu olhar, meu olhar, meu olhar

Sou caipira pirapora nossa
Senhora de Aparecida
Que ilumina a mina escura
e funda o trem da minha vida

Nada acabou, pois a frustração do golpe não mudou o bolsonarismo

Bolsonaro determina que militares celebrem o Golpe de 1964

Charge do Lattuff (ANDES)

Janio de Freitas
Poder360

Se há conspiradores presos, não é razoável, para nem falar na igualdade constitucional perante a lei, que seu chefe continue em liberdade e atividade política. Tanto mais que Bolsonaro é reconhecido nas conclusões da investigação como a figura central e pessoalmente decisiva do plano, inclusive, de assassinatos do presidente do país, do vice-presidente e de um magistrado.

E ainda, como se quisesse lembrar a necessidade de sua prisão preventiva, o próprio Bolsonaro admite a fuga para a Argentina. Os salvados pelo fracasso golpista não foram só os alvos pessoais revelados.

CARNIFICINA – O Brasil seria cenário de uma carnificina. Bolsonaro a incluiu em suas antecipações: “Vou acabar com toda essa petralhada” / “É preciso morrer uns trinta mil” (em comício no Acre e em muitas outras ocasiões, com e sem número).

Muitos dos tidos como esquerdistas sangrariam nas ruas e nas cadeias, escalados pela sanha liberada. É o ideal bolsonarista, militar e civil, de “limpeza”.

Ao menos por precaução, os êxitos da Polícia Federal, do Supremo e do Ministério da Justiça nos inquéritos do complô não dispensam a continuidade do alerta e da investigação. Os citados 37 do círculo conspiratório não bastariam para levar o golpe à extensão anti- institucional pretendida já no seu deslanchar. Para isso, precisaria eclodir pelo país afora, por mobilização militar.

COMANDO DIVIDIDO – O relatório da PF transcreve uma contagem da divisão no Alto Comando, a uma altura imprecisa da conspiração:

“Três querem muito, cinco são contra, os outros estão na zona de conforto”. Estes últimos são os que esperam indícios mais claros para definir-se ou escondem a definição já feita.

Apesar da posição periférica, são os definidores da maioria dos golpes militares, com a adesão final a um dos lados: Amaury Kruel, em razão de contato com grandes empresários de São Paulo; Médici, usando os alunos da Amam como soldados, na Rio-SP.

ADESÕES NOS ESTADOS – O complô precisava de adesões nos Estados e as teve, com certeza, contra possíveis resistências, prenunciadas na divisão do Alto Comando. O que não faltava e não falta são bolsonaristas nos quartéis, como aos bolsonaristas de quartel não faltam as convicções reunidas no complô.

A frustração dos assassinatos, da matança e do golpe em geral não mudou o bolsonarismo, nem o direitismo militar extremista. O seu silêncio é de comunhão com o complô desventrado. Bolsonaro planejou, um dia, explodir o principal conduto de água para o Rio. Com outros tenentes, o plano foi explodir bombas em quartéis. Queriam ganhar mais.

O comando do Exército e a Justiça Militar fingiram que só Bolsonaro era “um mau militar”, deram-lhe o posto e o ganho de capitão, para que passasse à reserva. Há muitos “maus militares”, em todos os níveis, para fazer ou iniciar ações contra procedimentos legais que levem Bolsonaro e seus comparsas ao destino justo das prisões. Sempre que possibilidades assim foram desprezadas, a realidade as confirmou.

A operação de Lula, o entendimentos sobre a reforma tributária e a sua votação

Médico descarta licença: “não saiu da Presidência e não sairá”

Pedro do Coutto

De repente um imprevisto acontece na política e dependendo do grau em que ocorre, a importância cresce, a exemplo do ocorrido com o presidente Lula da Silva, internado às pressas no fim da noite desta segunda-feira no Hospital Sírio-Libanês em São Paulo após passar o dia com dor de cabeça. Ele achava, na verdade, que estivesse ficando com gripe. Ainda em Brasília, ele havia passado por um exame de imagem, que mostrou uma nova hemorragia intracraniana, de cerca de três centímetros.

A tomografia constatou um novo sangramento na região do cérebro. Um sangramento até mais importante. Foi submetido a uma ressonância magnética, que comprovou o sangramento, e, depois de discutido com a equipe médica, se optou pelo procedimento cirúrgico. Lula foi, então, transferido para a unidade do Sírio em São Paulo. Durante todo o percurso, ele esteve lúcido, orientado e conversando. Embora, na queda, Lula tivesse batido a região da nuca, o hematoma estava na região do lobo fronto-parietal.

LICENÇA  – Ontem, o médico de Lula, o cardiologista Roberto Kalil Filho disse que não haverá necessidade de o presidente se licenciar do cargo nos próximos dias. “Lula não saiu da Presidência e não sairá. Ele deve voltar a Brasília na semana que vem”, disse o cardiologista, acrescentando que o presidente já estava acordado, conversando normalmente e se alimentando.

Pode ocorrer que, a operação do presidente, sem maior gravidade, tenha reflexos nos entendimentos sobre a reforma tributária e até mesmo em sua votação. O Globo de ontem, focalizou a iniciativa do senador Eduardo Braga. O relator na Casa do principal projeto de lei de regulamentação da reforma tributária, Braga apresentou nesta segunda-feira, o seu relatório com mudanças em relação ao texto aprovado na Câmara.

IMPACTO – Se aprovadas, as novas emendas vão representar um impacto extra de 0,13 ponto porcentual sobre a alíquota-padrão do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA),  que vai substituir os atuais tributos sobre o consumo. Com isso, a alíquota média subiria de 27,97% (considerando o texto que saiu da Câmara) para 28,1%.

O impacto é grande e o problema terá que ser resolvido rapidamente, pois a votação do orçamento depende da fixação desse valor. O reflexo da apresentação da emenda nos jornais de ontem será grande e muito maior será a discussão sobre o tema. De qualquer forma, representa um problema para o ministro Fernando Haddad, que terá que enfrentar mais essa colisão.

Por que há diferença entre militares e civis no corte de gastos?

O novo Brasil |

Charge do Freddy Varela (Arquivo Google)

Janio de Freitas
Poder360

O governo Lula falta com alguma explicação por concentrar em programas sociais os projetados cortes de gastos, cobrados pela pressão empresarial. Não bastando a primeira aberração, passa a dever explicação também para a diferença entre militares e civis na adoção de cortes.

O rombo causado pelo gasto com aposentadorias e pensões militares é, proporcionalmente, o mais oneroso nas contas previdenciárias.

PRIVILÉGIOS – As pensões vitalícias às filhas solteiras, muitas vivendo como solteiras-casadas para manter o privilégio, criaram um custo exclusivo, e sempre criticado, para militares. Mas longe de único e ainda motivo de discussão.

A muito custo, e em razão de desgastes de imagem, um outro privilégio com efeito previdenciário foi submetido a uma alteração de meia-sola.

Sem qualquer justificativa possível, ao passar para a reserva, ou aposentadoria, o militar recebia a promoção e a remuneração do posto superior.

FALSA SOLUÇÃO – Com mais de um século, o privilégio foi enfrentado à brasileira: acabou-se a promoção ao posto superior, coronel passou a sair como coronel, fragata como fragata. Mas as condições do posto superior permaneceram. Caso único em que aposentadoria não acarreta perda, nem preserva a remuneração: aumenta-a.

Evitar a passagem antecipada para a reserva é fazer cortes antecipados no aumento do gasto previdenciário. Por isso o governo propõe a idade mínima de 55 anos para o afastamento voluntário.

 Como outro privilégio deu aos militares a inclusão no tempo de serviço, para todos os fins, dos seus anos de colégio militar (desde os 11 de idade), a aposentadoria com vantagens integrais poderia ser já aos 46 anos de idade.

DISSE O GLOBO – “Governo ajusta regras após pedido dos militares”, foi o título do O Globo. Em reunião no Planalto, na semana retrasada (dia 30), o presidente e alguns ministros ouviram que os militares reivindicam a idade mínima apenas para os militares vindouros.

O “ajuste”: o governo dispôs-se a “estudar”, logo, a ceder em alguma medida. Não há problema de forma nem de teor na pretensão.

Nem haveria no lado do governo, não fosse a força de umas poucas interrogações.

EXCLUSIVIDADE -Que outros setores atingidos pelos cortes ou neles interessados, como os militares e certo empresariado, tiveram acesso a uma reunião no Planalto para argumentar contra suas perdas, e se verem atendidos? De fato, nenhuma?

Qual é, neste caso, a diferença para os governos de outros partidos? Trabalhadores do salário mínimo, aposentados e pensionistas do INSS, recebedores de abono, dependentes de ajudas reguladas pelo mínimo, tantos, são os milhões visados pelos cortes nas insignificâncias que, deste governo, esperavam uma dose veraz de correção.

Na sala do comandante do DOI-Codi, dava para ouvir gritos dos torturados

Aos 100 anos, morre no Rio de Janeiro o jornalista Hélio Fernandes

Helio Fernandes retrata sua primeira prisão no Rio

Carlos Newton

Conforme explicamos ontem, a Tribuna da Internet sofreu há alguns anos um brutal ataque de hackers, que atingiu nossos arquivos, destruindo importantes textos de Helio Fernandes, Carlos Chagas, Sebastião Nery e outros jornalistas que não estão mais entre nós.

Mas sobraram alguns artigos que o comentarista José Guilherme Schossland, ex-vereador catarinense, havia preservado. O texto a seguir é mais um deles, que vale a pena ler de novo.

###
NA MINHA PRIMEIRA PRISÃO, CONSTATEI
QUE POUCOS ESCAPAVAM DA TORTURA

Helio Fernandes

O excelente repórter Chico Otávio, de O Globo, entrevistou o coronel Riscala Corbage, que disse textualmente: “Torturei mais de 500 presos”. Como os outros envolvidos, principalmente o coronel Paulo Belham, (que foi logo silenciado), se despediu do jornalista com a afirmação: “Não tenho o menor peso na consciência”. Belham também tinha sua frase de bolso: “Não tenho remorso ou arrependimento”.

Chico Otávio encerrou sua reportagem com essa confissão, mas começou de maneira ainda mais jornalística: “O cara urra de dor”.

MENTINDO – Só que os Corbage e Belham mentiam avidamente, por simples exibicionismo. Acreditavam que confessando e exagerando, voltariam ao apogeu.

Os dois já estão acima dos 80 anos, imaginavam (e Corbage ainda imagina) que nada aconteceria a eles.

Como todos os generais de 64, principalmente os que chegaram a “presidentes”, já morreram, os dois torturadores não pensavam que surgisse essa expressão de duas palavras: “crimes imprescritíveis”.

500 TORTURADOS? – Corbage, esse capitão da Polícia Militar, tenente-coronel na reserva, torturou muito e se pode desmenti-lo, com o maior prazer. Só que mente em alta velocidade, desabaladamente. O Exército sempre teve desprezo e desapreço pela Polícia Militar. E esta, total ressentimento, por causa da hierarquia.

Os oficiais da Polícia Militar só chegavam a coronel, paravam por aí. E os comandantes eram sempre generais, lógico, do Exército. Lutaram dezenas e dezenas de anos para mudar a situação. Só foram conseguir quando se revoltaram contra o general Fiuza de Castro (o filho, o filho, o pai era ótima figura, a genética não exerceu o seu poder).

E esse Fiuza de Castro foi um dos mais displicentes comandantes do DOI-Codi. Não torturava pessoalmente e provavelmente não sabia de tudo o que acontecia. Mas existiam centenas de oficiais do Exército servindo no DOI-Codi e não deixariam que um Capitão PM exercesse tanto Poder para a tortura de “500 presos”.

CONFISSÕES DE MIM – Em minha primeira ida ao DOI-Codi, seu comandante era precisamente Fiuza de Castro (o filho, o filho…).

Saltei lá naquela entrada enorme, com cartazes do PIC (Pelotão de Investigação Criminal), uma figura fardada apontando um dedo para a frente, como se fosse uma ameaça, devia ser mesmo.

Mais ou menos 11 da noite. O Exército não transportava presos, aqui no Rio isso era feito pela polícia. Eles me diziam: “Ficamos assustados em trazer alguém, sabemos o que acontece”. Me levaram para uma sala, um major explicou: “O general Fiuza já foi comunicado, está chegando”.

GRITOS DE TORTURA – O prédio do DOI-Codi não era tão grande quanto parecia. Dava para ouvir gritos de tortura, incessantes, assustadores, mortais. Um capitão até de boa aparência, sussurrou: “São todos muito jovens, choram por qualquer coisa”. Não deu para saber se ele era contra a tortura ou se depreciava a reação dos torturados.

O general Fiuza levou quase duas horas para chegar, não cumprimentou ninguém, sentou numa cadeira distante. Vestia calça cinza e paletó de xadrez, nenhum jogo de palavras. Inesperadamente olhou para mim, falou: “Gosto muito quando o senhor escreve sobre futebol, por que tem que se meter na nossa vida?”.

Entendi que não seria torturado, porque a imprensa inteira sabia de minha prisão, que seria manchete de todos os jornais. Mas dava para ouvir gritos de tortura, incessantes, assustadores, mortais.

Perda de tempo congestiona Congresso e atrasa agenda econômica

Charge do JCaesar | VEJA

Dora Kramer
Folha

Desta quinta-feira (5) até o último dia útil (sexta-feira, 20 de dezembro) antes do recesso, o Congresso Nacional tem 12 dias para examinar, debater, fazer ajustes e votar o pacote fiscal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, o Orçamento de 2025 e a regulamentação da reforma tributária.

Isso só falando das urgências urgentíssimas da pauta econômica de interesse do governo. Um afogadilho do qual boa coisa não se pode esperar, mas está feito.

TEMPO PERDIDO – Poderia ter sido diferente. O problema é que se perdeu muito tempo ao longo do ano em que as atividades legislativas foram suspensas devido a campanhas eleitorais às quais deputados e senadores deveriam dedicar apenas o fim de semana estendido de sexta a segunda-feira.

Não foi só isso. Houve desperdício de energia e atenção com tolices de costumes, com atritos envolvendo o Judiciário, com o embate das emendas permeado de chantagens, com barbeiragens políticas do Planalto e, por fim, com o processo (in) decisório do presidente Lula em relação aos cortes de gastos.

Faz tempo que os ministros Fernando Haddad e Simone Tebet começaram a falar nos estudos de contenção de despesas. Portanto, se supõe que estivessem elaborando as medidas desde então, bem antes das eleições municipais depois das quais, segundo eles, haveria o anúncio.

MAIS ATRASOS – Passou-se mais de um mês antes de, enfim, o país conhecer o que o governo entendia como o ajuste necessário para o equilíbrio das contas, e aí já estávamos em dezembro.

Pacote concebido para atender ao mesmo tempo aos ditames da economia e às conveniências da política, foi por isso recebido com alto grau de desconfiança. Há um cipoal de projetos de variados formatos e propostas de emendas constitucionais que chegam a conta-gotas no Congresso a ainda sem que se tenha deles compreensão clara.

Se o pessoal especialista em números ainda não entendeu direito o que ali são promessas vãs e meras intenções de modo a separá-las de decisões de fato consequentes, o que dirá do entendimento a ser alcançado por um colegiado de 513 deputados e 81 senadores que em sua maioria não são do ramo.

APENAS 12 DIAS – Repetindo: são 12 dias descontados os fins de semana e considerada a duvidosa semana de cinco dias.

Ainda que houvesse dedicação exclusiva com um “intensivão” para dar a eles familiaridade aos meios e modos da economia, isso implicaria deixar de lado o Orçamento e a regulamentação da reforma tributária. Temas também complexos.

Uma solução para corrigir o atraso de responsabilidade compartilhada por Executivo e Legislativo seria a convocação extraordinária do Congresso em janeiro, por iniciativa de um dos dois Poderes. Já foi prática comum no passado, não é mais.

ESTÃO EXAUSTOS – Trabalhar no recesso está fora de cogitação. Afinal, suas altezas devem estar muito cansadas depois da exaustiva jornada eleitoral que, embora municipal, tem reflexo nas respectivas sobrevivências políticas em 2026.

Deve ter sido extenuante também o processo de construção de unanimidades para a sucessão nas presidências da Câmara e do Senado. Ocorre em fevereiro de 2025, mas a arquitetura de interesses internos ocupou 2024 todo.

Portanto, o mais provável é que se recorra ao chamado esforço concentrado em votações atabalhoadas. Nelas, valorizam-se os prazos em detrimento do conteúdo.

HAJA JABUTIS… – E mais: num ambiente de toque de caixa é onde costumam se criar os jabutis, bichinhos que não sobem em árvores a não ser por obra de enchentes ou mãos de gente.

Aqui o que veremos será a pressa sendo muito amiga da imperfeição, cujo efeito para ficar no campo dos ditados— é o risco de o país comer esse repasto todo cru e muito quente.

PF gastou 880 páginas para criar a narrativa de um golpe impossível

Moisés Calado 🇧🇷🇷🇺🇮🇳🇨🇳🇿🇦+ on X: "Jair na cadeia!  https://t.co/vywc8uxe4T" / X

Charge do Nando Motta (Arquivo Google)

J.R. Guzzo
Revista Oeste

O Supremo Tribunal Federal está impondo ao Brasil, na base da pura força bruta, um estado de selvageria legal jamais visto nos seus 135 anos de existência como República. Não se trata, infelizmente, de uma opinião. Opiniões podem estar erradas — frequentemente estão erradas, aliás. Fatos, ao contrário, sempre são fatos, e existem porque existem.

Todo mundo tem o direito a acreditar que dois mais dois são sete, digamos, ou que a água ferve a 45 graus. É o que está dizendo o STF. Mas dois mais dois vão continuar sendo quatro, e a água vai continuar fervendo a 100 graus centígrados.

TUDO SEM NEXO – Nada a fazer, certo? Errado. O Supremo faz — e com isso destrói o país, a lei e a ordem. O ministro Alexandre de Moraes e seus acompanhantes no STF querem que você acredite que um aglomerado de 37 pessoas, a lotação de um ônibus, quis dar um golpe de Estado no Brasil.

Não faz nenhum nexo racional — e não vai fazer nunca. Não é possível, de jeito nenhum, derrubar um governo sem que pelo menos um soldado se mexa do lugar, sem tirar um tanque da garagem e sem dar ordens específicas a nenhuma autoridade. Ninguém, nunca, deu um golpe militar se o Exército em peso ficou contra esse golpe.

Não dá para dar um golpe com uma verba de R$ 100 mil. É impossível, apenas isso. Qualquer dúvida a respeito pode ser eliminada com uma leitura rasa das 880 páginas de acusações que a Polícia Federal acaba de encaminhar à Procuradoria-Geral da República.

ORDENS DE MORAES -A polícia e o Ministério Público, no caso, são cumpridores das ordens que recebem há dois anos seguidos do ministro Moraes — que, por sinal, se coloca na posição de vítima de uma tentativa de assassinato, chefe das investigações, promotor e juiz do processo, coisa que não existe em nenhum país civilizado do planeta.

O total das provas reunidas pela PF, objetivamente, está entre o zero e a raiz quadrada do zero. O que a polícia apresentou, após quase 700 dias de investigação, fica abaixo do que fazia o grande Bolinha França, quando resolvia se fantasiar de toca-discos ou de Abominável Homem das Neves para investigar, incógnito, as delinquências que sempre jogava em cima do pai da Luluzinha, o simpático Sr. Palhares.

O detetive Bolinha estava errado em 100% dos seus casos; nunca acertou uma. O inquérito do golpe está indo por aí.

SEM LÓGICA

– O relatório consegue ir da primeira à última palavra sem uma única acusação lógica, sem qualquer prova que possa ser levada a sério em qualquer parquet do mundo democrático e, sobretudo, sem qualquer ligação coerente com o seu denunciado número 1, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Tudo o que a polícia conseguiu apresentar em seu relatório, uma geleia geral escrita em português primitivo e sem qualquer vestígio de análise lógica ou vida inteligente, são conversas sem pé nem cabeça entre um bolo de subordinados que não tinham autoridade para dar ordens a um guarda-noturno — nec caput nec pedes, como diriam os ministros em seu latinório de curso ginasial.

Eles disseram o que a PF diz que disseram? Podem ter dito e repetido, mas e daí?

TUMULTO MENTAL – Os diálogos são apenas uma demonstração clara de tumulto mental agravado, como essas coisas que você lê na internet garantindo que a China tem uma base secreta na Lua, que o Brasil precisa de um “banho de sangue” para “limpar a política” ou que John Lennon continua vivo em algum lugar do mundo — é isso, e só isso.

Não há nenhuma menção ao tipo de veneno que seria usado para matar o presidente — e nem por que os líderes militares do golpe, todos eles com acesso legal a armas de fogo, precisariam de veneno para realizar o seu plano.

Um padre de Osasco faria parte do “núcleo jurídico” do golpe. Um padre no “núcleo jurídico”? Por que um padre? O golpe, aliás, teria “seis núcleos”. Nenhum dos acusados, em nenhum lugar, fala em núcleo de coisa nenhuma. Foi a PF que inventou a coisa dos “núcleos” — e passou a apresentar a sua criação como prova do crime.

E BOLSONARO? – Não está claro, como nunca esteve desde o começo dessa história, por que Bolsonaro não deu o golpe de que é acusado quando era presidente da República e comandante em chefe das Forças Armadas.

Não há, em nenhum ponto do inquérito, qualquer indício de que ele tenha tentado dar alguma ordem nessa direção, nem direta nem indireta.

Se ele tinha algum desejo real de impedir a posse de Lula e continuar na Presidência, por que saiu do governo, até antes da hora certa, foi para os Estados Unidos e só depois tentou dar o golpe — sem um único e escasso pelotão de tiro de guerra, e com uma turba de motoboys, barbeiros e até um autista, em vez de generais de Exército, brigadeiros do ar e almirantes de esquadra? Vai saber.

Próximos dias serão cruciais para avaliação do quadro de Lula

Cicatriz na nuca de Lula

Cicatriz na nuca de Lula mostra que foi um choque forte

Cláudia Collucci
Folha

A recorrência do sangramento intracraniano sofrido pelo presidente Lula (PT) tinha 3 cm de diâmetro e pode aumentar as chances de novas hemorragias e demandar um tempo maior de recuperação, segundo neurologistas. Por outro lado, o petista tem um bom prognóstico por ter tido acesso a uma boa equipe e não ter nenhuma alteração neurológica, afirmam.

Lula sentiu fortes dores de cabeça e, depois de exames feitos no Hospital Sírio-Libanês em Brasília, foi transferido para a unidade de São Paulo para uma cirurgia de emergência de drenagem do hematoma.

RECORRÊNCIA – A hemorragia intracraniana está relacionada à queda sofrida por Lula no último dia 19 de outubro. Nesses casos, as chances de recorrência variam entre 15% e 20%, segundo a literatura médica.

Segundo seus médicos, Lula está estável, conversa e se alimenta normalmente e não há comprometimento cerebral. O hematoma diagnosticado no presidente é chamado de subdural crônico frontemporal.

“No crânio, depois do osso, a gente tem três membranas, que são as meninges. Esse hematoma está entre a primeira e a segunda. Ele está abaixo da dura mater, que é a camada mais espessa e mais próxima do osso. Ele tem um contato médio com o cérebro porque tem outras meninges protegendo [o cérebro]”, explica a neurocirurgiã Ana Gandolfi, coordenadora do setor de emergências neurocirúrgicas da Escola Paulista de Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

PACIENTE IDOSO – Segundo ela, a recorrência do sangramento, após um primeiro evento provocado por queda, não é incomum entre os pacientes mais velhos.

“O paciente mais idoso tem uma atrofia cerebral, naturalmente. A gente fica com um espaço um pouco maior. Mesmo pequenos traumas levam a microssangramentos, que vão crescendo naquele ambiente ao longo do tempo.”

Na avaliação de Ana Gandolfi, baseada nas informações dadas pela equipe médica de Lula em entrevista coletiva, a cirurgia feita no presidente é de menor porte e não está associada a inchaço no cérebro.

“O hematoma tem um crescimento lento, o cérebro vai reacomodando. Ele não tem uma lesão neurológica do tecido cerebral, então, normalmente, é menos grave”, diz.

EVOLUI BEM – Por ter sido operado sem nenhum tipo de alteração neurológica, as chances de sequelas são menores, segundo a médica. “Normalmente, é um paciente que evolui bem.”

A mesma avaliação tem José Oswaldo de Oliveira Júnior, neurocirurgião do Hospital do Servidor Estadual de São Paulo, com a ressalva de que não dá para garantir neste momento que o presidente está livre de novas intervenções ou sequelas.

“É um procedimento que não é de grande porte, geralmente está associado a uma boa evolução, mas não é possível garantir que não haja necessidade de uma reintervenção porque pode ter recidiva do crescimento [do hematoma] e aparecimento novamente [de sangramento] para você drenar mais tarde.”

SEQUELAS – Também para o neurocirurgião Luiz Severo, as chances de sequelas ainda existem, e tudo vai depender de como será a evolução do presidente nos próximos dias e se haverá necessidade de outras abordagens, por exemplo, mais uma cirurgia para estancar um eventual novo sangramento.

“É preciso vigilância para o risco de epilepsia, riscos de novos sangramentos e de alterações cognitivas”, diz.

Segundo Severo, hematomas podem comprimir áreas importantes do cérebro, como da fala, da motricidade e das emoções, causando sequelas que incluem dificuldades motoras (fraqueza, por exemplo), problemas de fala, alterações cognitivas (como dificuldade de memória, concentração e raciocínio) e emocionais, como depressão e ansiedade.

REABILITAÇÃO – “Algumas pessoas podem experimentar déficits cognitivos temporários, enquanto outras podem ter dificuldades de longo prazo. A reabilitação pode ser necessária para ajudar na recuperação das funções cognitivas.”

Também há chances de o paciente desenvolver quadro de epilepsia. “Não é à toa que sempre fazemos anticonvulsivante no pós-operatório em todos”, explica o médico.

Outro risco, diz o neurocirurgião, é a necessidade de novas intervenções cirúrgicas, aumentando riscos de mais lesão. Por outro lado, pondera, a neurocirurgia está cada vez mais segura, com incisões menores e menor risco de lesões. “O presidente certamente teve acesso ao melhor e isso traz melhor prognóstico.”

TEMPO MAIOR – Segundo Severo, esse novo sangramento pode demandar um tempo maior de recuperação. “Na primeira vez, ele ficou sob vigilância nas primeiras 48 horas do edema cerebral. Agora ele foi operado. Após uma craniotomia, a gente recomenda repouso de 15 a 30 dias, considerando que não tenha nenhum tipo de complicação.”

Em entrevista coletiva nesta terça-feira, a equipe médica de Lula disse que ele foi submetido a uma trepanação, que é uma pequena perfuração no crânio. Segundo afirmaram, o termo craniotomia, que constava de boletim médico inicial, costuma ser usado para intervenções maiores.

Na opinião do neurologista Oliveira Júnior, do Hospital do Servidor Estadual, além do repouso, é recomendável que Lula evite viagens nas próximas semanas, especialmente as aéreas.

SEM VIAJAR – “As viagens aéreas têm um risco por causa da variação da pressão. Normalmente, quando você fecha a porta de um avião, você pressuriza o ambiente, fica com uma pressão bem mais aumentada dentro do que fora. Só esse tipo de variação já pode não ser benéfica para o paciente”, afirma.

A depender da evolução do quadro clínico, o presidente também pode necessitar de um acompanhamento médico mais contínuo, na avaliação de Luiz Severo.

“Pode incluir consultas neurológicas regulares para monitorar a recuperação e identificar precocemente quaisquer complicações; fisioterapia, para ajudar na reabilitação motora, caso haja fraqueza ou problemas de coordenação; fonoaudiologia, se houver dificuldades de fala ou linguagem; e avaliação psicológica, para lidar com questões emocionais e cognitivas.”

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Caramba, a equipe médica não sabia que tipo de operação fez, teve de corrigir. Em tradução simultânea, o problema é grave e os próximos dias serão fundamentais para avaliar o paciente, pois quem está impaciente é o vice Geraldo Alckmin, jogado para escanteio na hora em que deveria assumir. (C.N.)

Dalton Trevisan deixou a obra falar por ele e foi genial o tempo todo

Morre Dalton Trevisan, o “Vampiro de Curitiba” e gênio da literatura  brasileira, aos 99 anos | Diário de Curitiba

Trevisan recusava entrevistas e fugia dos fotógrafos

André de Leones
Estadão

Dados o aspecto reservado da personalidade do escritor curitibano Dalton Trevisan, que morreu nesta segunda-feira, 9, aos 99 anos, e a forma como ele conduziu sua vida profissional, a melhor maneira de abordar sua enorme contribuição à literatura é ignorar detalhes pessoais e privados e se fixar na produção ficcional.

O epíteto que lhe infligiram, relativo ao título de seu livro mais conhecido, O Vampiro de Curitiba, diz muito do estranhamento com que costumam ser vistos autores que preferem deixar que as obras falem por si, mantendo-se longe dos holofotes e da interminável procissão de egos que caracteriza o meio literário.

SEMPRE GENIAL – Trevisan ocupou-se de escrever e de silenciar, e foi genial em ambas as atividades. Graças à primeira dessas atividades, foi agraciado com os prêmios Camões, Machado de Assis, Portugal Telecom, APCA, Biblioteca Nacional e Jabuti, entre outros.

Embora tenha escrito um romance, “A Polaquinha”, e novelas como “Mirinha” e “Nem te Conto, João”, Trevisan firmou-se como um dos melhores e mais inventivos contistas brasileiros desde “Novelas Nada Exemplares”, lançado em 1959.

Antes, publicara histórias em folhetos e na revista “Joaquim” (1946-48), fundada por ele, Erasmo Pilotto e Antônio P. Walger. A concisão, “o olho aberto no escuro”, a utilização e reinvenção da linguagem coloquial, as imagens (“Bastava dizer João, eu beijava o sexto dedo do pé”; “cada morto é uma flor de cheiro diferente”; “O tropel de corvos no telhado: era a chuva”) e as repetições, elipses e supressões — tudo isso já marca presença em “Novelas Nada Exemplares”.

NO COTIDIANO – Ao se fixar nas existências corriqueiras, mais a-heroicas do que anti-heroicas, e não raro marcadas por ocorrências trágicas (“A mulher chorava de pé, a cabeça apoiada na parede. Uma vizinha esfregava vinagre nos pulsos do menino desmaiado. Debruçou-se o pai na cama — a criança virou o branco do olho”).

Também com circunstâncias ridículas (“Paulo reparou nas duas sombras. Uma, bule de chá, gorda e grávida. Outra, selvagem albatroz da noite, abrindo asas na glória de arremeter voo”), Trevisan cria e recria dramas domésticos e não raro comezinhos, elevando-os por meio de um trato único com a linguagem e as estruturas narrativas.

Em uma bibliografia extensa e geralmente associada à repetição, impressiona como o autor jamais se perde. É como se Curitiba e seus habitantes continuamente nos escapassem ou se tornassem outros, e outros, e outros, deixando estilhaços, fragmentos e restos humanos que, somados, apontam para uma completude maior, uma integridade ulterior — a própria obra literária de Dalton Trevisan

Escanteado, Alckmin não assume e finge que está tudo bem

Jornal Correio | Após cirurgia de Lula, Alckmin assumirá agendas com primeiro-ministro da Eslováquia

Impedido de assumir, Alckmin comparece ao Planalto

Mariana Schreiber
BBC News Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve ficar uma semana internado em São Paulo, se recuperando de uma cirurgia de emergência realizada na noite de segunda-feira (9/12), por causa de uma hemorragia intracraniana, sequela da queda em que ele bateu a cabeça em outubro.

Segundo a equipe médica do presidente, Lula deixou a sala de cirurgia sem “nenhum comprometimento no cérbero” e está “lúcido, falando e se alimentando”, mas ainda precisa se recuperar e só deve receber alta e voltar a Brasília no início da próxima semana.

“O presidente está tranquilo, [precisa] repousar, nada de trabalho por enquanto”, disse o médico pessoal de Lula, Roberto Kalil Filho.

A previsão do Palácio do Planalto, no entanto, é que Lula não vai se licenciar da Presidência da República e continuará formalmente no cargo.

ALCKMIN ESVAZIADO – Na prática, o vice-presidente Geraldo Alckmin assumiu parte da agenda que estava prevista para Lula nesta terça-feira (10/12). Ele cancelou um compromisso que teria em São Paulo e voltou cedo a Brasília para uma reunião bilateral com o Primeiro-Ministro da Eslováquia, Robert Fico.

Segundo professores de Direito ouvidos pela BBC News Brasil, não há regras claras na legislação brasileira sobre a substituição do presidente em caso de internação.

O artigo 79 da Constituição dá orientações vagas: “Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente”.

SEM REGRAS – Para o advogado Felipe Fonte, professor de direito público da FGV, a Constituição “é lacônica” sobre as situações de impedimento, deixando muito a critério do presidente como proceder.

Ele lembra que o ex-presidente Jair Bolsonaro chegou a despachar do hospital durante seu mandato quando passou por algumas internações decorrentes da facada que sofreu na campanha de 2018.

Assim que assumiu o cargo, Bolsonaro passou por uma cirurgia em janeiro de 2019 e ficou 18 dias no hospital. Na ocasião, ele tirou licença médica apenas nos dois primeiros dias, período em que passou temporariamente o cargo para seu vice, general Hamilton Mourão. A situação se repetiu em setembro daquele ano, quando Mourão assumiu a função por cinco dias, metade do período de internação.

MOURÃO BLOQUEADO – Já em 2021, quando Bolsonaro foi internado de emergência devido a uma obstrução no intestino, os dois estavam brigados e Mourão não assumio o cargo e preferiu manter uma viagem para Angola, onde participou da Cúpula da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Para o constitucionalista Diego Werneck, professor do Insper, a falta de detalhamento da Constituição sobre as situações de afastamento faz com que essa decisão, geralmente, seja tomada em acordo entre o presidente e o vice.

“A Constituição não regula em detalhes o que é impedimento e a gente não deveria imaginar que isso tem que ser entendido de uma forma muito abrangente”, afirma.

###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
E assim Geraldo Alckmin enfim compreendeu que ser vice de Lula é igual a Pedro Aleixo ser vice de Costa e Silva. Tem o cargo, recebe o belo salário, mora num palácio, com tudo pago, mas não assume. (C.N.)

“Controle das redes” pelo Supremo será uma censura implacável

Tribuna da Internet | Quando tenta “desmentir” a Tribuna, o Planalto sempre faz papel ridículo

Charge do Rice (Arquivo Google)

J.R. Guzzo
Estadão

Entre todos os desvarios impostos hoje à vida pública brasileira poucos se podem comparar ao esforço desesperado do STF e da esquerda nacional para criar a censura nas redes sociais. Nada pode se igualar, é claro, ao golpe dos estilingues, do batom na estátua (“substância inflamável”, diz o ministro Alexandre de Moraes) e dos oficiais subalternos que não tinham autoridade para dar ordens a um cabo do tiro-de-guerra de São José dos Ausentes.

Aí já é medalha de ouro, e não sobra para ninguém. Mas a censura vem logo atrás, coladinha.

MAIOR ABSURDO – A censura do regime STF-Lula, com o apoio neurastênico, agressivo e irracional das classes culturais, é uma mentira dentro de uma mentira. É simples: estão fazendo o maior ataque à liberdade de expressão jamais visto na história da República, mas juram que seu programa de censura não é censura.

Dizem que é “controle das redes sociais”, onde haveria uma “terra sem lei” que ameaça a própria sobrevivência da nação. Essa terra não é sem lei, e nunca foi.

Está sujeita às regras do Código Penal e do Marco Civil da internet. Também não ameaça a sociedade – só ameaça a eles mesmos. E é censura, porque pune quem quer dizer o que pensa.

DIZ TOFFOLI – E nada define tão bem a boçalidade espetacular da censura do STF do que a desculpa que o ministro Toffoli acaba de dar para ela.

Não se pode admitir, na sua opinião, que a liberdade de expressão seja usada para a polícia jogar gente de cima da ponte, como ocorreu há pouco em São Paulo. Mas o que uma coisa tem a ver com a outra?

Tudo a ver, diz Toffoli. O policial fez o que fez pela “falta de lei” da internet: achou que o direito à sua livre expressão incluía atirar o infeliz lá do alto. Viram como é um perigo deixar as pessoas lerem e escreverem o que bem entendem nas redes sociais?

MULTAS LEVES – Toffoli diz que multas contra o X foram ‘muito leves’ e Moraes diz que vai ‘rever’ imposições.

Ora, não adianta dizer que isso é apenas mais uma estupidez privada de um repetente que foi reprovado duas vezes seguidas no concurso para juiz de direito antes de ganhar seu lugar no STF.

Tire-se o verniz de segunda categoria que os outros ministros usam em suas encíclicas a respeito do tema e vai se ver a mesma indigência. O problema deles não tem solução.

CALAR A INTERNET – Dizem que “não é censura”, pois não afeta a mídia convencional. Mas o regime não precisa censurar a mídia convencional. O quer, mesmo, é calar a internet – onde, pela primeira vez nas suas vidas, todos os brasileiros podem dizer o que querem, dia e noite, sem pedir licença aos jornalistas, aos professores da USP e aos bilionários com “pegada social”.

O problema real do regime STF-Lula é o povo brasileiro. Se ele puder pensar, dizer livremente o que pensa, e tirar suas conclusões sobre o que ouve, atrapalha tudo.

No país das maravilhas, Lula põe a culpa no ministro da Comunicação

Marqueteiro Sidônio Palmeira é cotado para assumir Comunicação do governo  Lula - Portal deAmazônia

Lula decidiu transformar seu marqueteiro em ministro

Dora Kramer
Folha

Desde que os índices de popularidade engataram uma linha descendente, o presidente Luiz Inácio da Silva vem insistindo na ideia de que o problema do governo é a comunicação ruim.

Na semana passada, indicou que o talento para “vender” suas realizações será um dos critérios, talvez o primordial, para a reforma ministerial prevista para 2025. Chegou a fazer mea-culpa e chamou a si a tarefa de dialogar mais e melhor com a população.

FUGINDO À REGRA -Lula matou a falha no peito, coisa que não é do estilo dele, mais afeito a transferir culpas ao alheio. Disse que fala pouco (!) e prometeu aumentar a frequência de pronunciamentos sem atentar para a evidência de que frequentemente suas falas resultam em situações desfavoráveis.

O presidente parte do pressuposto de que o governo está maravilhoso, mas a sociedade não percebe isso porque a exposição das maravilhas não é feita corretamente.

Princípio básico da propaganda para definição de um sucesso de vendas é a qualidade do produto. Quando a mercadoria não é entendida como boa para o consumo, o público não compra.

É OBRIGAÇÃO – Daí a dificuldade de convencer as pessoas a reagirem como o presidente gostaria que reagissem —sendo gratas a ele.

Atuar na redução da pobreza e do desemprego, para citar dois exemplos, é obrigação e não algo passível de recompensa.

Do ponto de vista político, a comunicação do pacote de corte de gastos foi bem montada, com estética de programas do horário eleitoral. Ressaltou benesses, minimizou medidas mais duras e evitou a palavra “corte”.

SEM CONTEÚDO – Tudo muito bem pensado e arrumado na forma, mas um desastre no conteúdo, ao misturar contenção de despesas com perda de receita, ao anunciar isenção de imposto obviamente eleitoreira para tentar pegar a classe média-baixa pelo bolso.

Economistas alertam que a boa nova dos números positivos de hoje pode ser a má notícia de amanhã, caso as contas não sejam administradas com firmeza e realismo.

Mas o governo prefere demonizar o chamado mercado, num embate ideológico anacrônico datado de uns 30 anos atrás, coisa que não se comunica com os tempos atuais.

###
NOTA DA REDAÇÃO  DO BLOGBelo artigo de Dora Kramer, que prima pela serenidade. Lula vai afastar o ministro da Comunicação e substituí-lo pelo marqueteiro Sidônio Palmeira, que tenta convencer os brasileiros de que Lula malha todo dia, está em ótima forma e pode ser candidato até o final dos tempos. Ou até o Brasil virar uma imensa Argentina. (C.N.) 

Na tentativa de salvar o amor, um poema bélico de Oswald de Andrade

Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral a bordo de um navio Foto: Crédito: Fundo Oswald de Andrade / Centro de Documentação Cultural Alexandre Eulálio

Oswald com Tarsila do Amaral, a primeira musa

Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, escritor, ensaísta, dramaturgo e poeta paulista José Oswald de Souza Andrade (1890-1954) foi um dos principais articuladores do movimento modernista literário e da célebre Semana de Arte Moderna, marco divisório na história das artes brasileiras, realizada em São Paulo, em 1922.

A rebeldia de Oswald o levava a querer muito mais do que simplesmente revolucionar forma e conteúdo da criação artística. O que ele queria mesmo era uma revolução que transformasse a vida social dos brasileiros, suas instituições e costumes.

Quanto ao amor, Oswald era considerado um sortudo, pois casou com duas das mulheres mais cobiçadas da época. Primeiro, com a pintora Tarsila do Amaral, e depois com Patrícia Rehder Galvão, conhecida como Pagu,  escritora, poetisa, diretora, tradutora, desenhista, cartunista, jornalista e militante comunista. 

ALERTA
Oswald de Andrade

Lá vem o lança-chamas
Pega a garrafa de gasolina
Atira

Eles querem matar todo amor
Corromper o pólo
Estancar a sede que eu tenho doutro ser
Vem do flanco, de lado
Por cima, por trás

Atira
Atira
Resiste
Defende
De pé
De pé
De pé
O futuro será de toda a humanidade.

Judiciário se agiganta e pode ameaçar as liberdades públicas

Tribuna da Internet | Brasil hoje é governado com base no rancor e vingança  entre os Poderes

Charge do Duke (O Tempo)

Luiz Felipe Pondé
Folha

A tradição de filmes sobre a ditadura está aí. O discurso comum é de que se faz necessário lembrar para não deixar acontecer de novo. Segue a rota dos filmes sobre o Holocausto que visariam manter a memória viva dos horrores contra as vítimas do nazismo.

Mas duvido da validade plena dessa estratégia. No caso do Holocausto, essa memória não impediu que grande parte do mundo apoiasse, ainda que fingindo não o fazer, o pogrom do dia 7 de outubro de 2023 realizado pelo Hamas, esses “resistentes contra a colonização”.

SEM CONFIANÇA – Chama a atenção o fato que grande parte desses apoiadores fingidos do massacre de israelenses vieram das classes mais letradas —as letras e as artes nunca merecem muito nossa confiança em períodos autoritários.

O ser humano é tal que nada o impede de achar justificativas para apoiar toda forma de violência contra quem ele detesta.

No caso da ditadura no Brasil, essa memória de nada adianta para evitar que formas de autoritarismo aqui se instalem. E, neste caso, levado a cabo por muitos daqueles que dizem se emocionar com as vítimas da ditadura.

GOLPE ANACRÔNICO – O golpismo bolsonarista é simétrico a esse equívoco histórico mencionado aqui. Um golpe anacrônico como se vivêssemos ainda na guerra fria dos anos 1960, levado a cabo por mentecaptos.

Trata-se de um presente dos deuses para quem baba de vontade de instaurar uma forma de autoritarismo típico do século 21, a saber, uma ditadura líquida —tomando de empréstimo conceito de Zygmunt Bauman (1925-2017).

Ainda que o totalitarismo fascista já praticasse essa forma de autoritarismo disperso pelas relações sociais e institucionais, no século 21, essa forma de destruição da liberdade política pode ocorrer sob a manta de um Estado de Direito disfuncional como o brasileiro.

ASSÉDIO SEXUAL – De repente, alguém acusa “X” de assédio sexual. Como se sabe, esse tipo de acusação tem efeito destrutivo imediato. O branding, uma das “formas de ponta” do aparelho repressor no século 21, rapidamente exclui qualquer pessoa suspeita de tal crime, sem possibilidade de defesa.0

Esse traço de conduta é típico da vocação à violência que a massa tem desde sempre. Profissionais de marketing exercem a função de promotores informais, mas eficazes.

O ministério público poderá acolher qualquer denúncia contra “Y” o que fará “Y” gastar rios de dinheiro para se defender. Mesmo que, ao cabo de anos, “vença” a causa, sua vida financeira estará arruinada. A chance de o casamento acabar e da relação com os filhos se despedaçar por causa da ruína financeira e da humilhação que se segue a um processo como esse é intensamente provável.

TEMAS POLÍTICOS – O tratamento dos temas políticos pela mídia, também, se faz elemento pró-destruição da liberdade política facilmente, bastando que editores do nível médio da hierarquia, apoiados silenciosamente pelos companheiros de consórcio dentro das redações, proíbam análises que não reforcem o status quo.

O mesmo mecanismo entrará em operação na rede de educação, hostilizando aqueles que não abraçarem a causa comum.

Um dos efeitos mais nefastos da chamada polarização é que ela destrói por dentro a dinâmica das relações entre posições institucionais em contenda. Enquanto a polarização reinar, não haverá espaço nenhum para sairmos dessa rota em direção à dissolução da tal democracia.

MAU JUDICIÁRIO – Com a crescente judicialização de tudo no século 21, gerando um mercado promissor para contenciosos e, por tabela, para advogados, empoderando a magistratura e associados, numa sociedade à deriva como a nossa, a tendência é que um dos braços armados da destruição da liberdade será o próprio Poder Judiciário que, supostamente, defenderia o Estado de Direito.

Quanto mais ativo é o Poder Judiciário, menor é a liberdade dos costumes e das ações invisíveis que sempre conduziram o cotidiano.

A infantilização crescente do que antes chamávamos de adultos aciona a magistratura o tempo todo para decidir quem tem o direito de falar uma palavra em detrimento de outra.

COMO TOTENS – Posições políticas hoje operam como totens, no sentido mais pré-histórico possível. Excluídos do cérebro racional, mais complicado e cansativo na sua fisiologia do que a adesão totêmica, que tem a seu favor a ancestralidade atávica, os totens impedem qualquer “avanço” na superação de quadros como o descrito aqui.

Empurram o sistema político para o leito de uma estrutura que mimetiza a democracia de um ponto de vista quantitativo e institucional, enquanto destrói esse mesmo sistema político de um ponto de vista qualitativo que acolheria o contraditório.

O totem é pleno, à democracia falta tudo.

Pacote de ajuste fiscal divide opiniões entre ex-ministros de Lula