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Gonet mostra que é um procurador que manipula provas
Leonardo Corrêa
Blog Cláudio Dantas
Antes de tudo, um esclarecimento. Não sou bolsonarista. Reconheço que o governo de Jair Bolsonaro teve seus erros e acertos. Se alguém quiser me acusar de partidarismo, recomendo que leia antes as críticas que fiz à Lava Jato no passado.
Entendo que toda acusação criminal deve ser conduzida com extremo rigor, pois é nesse campo que o poder do Estado se impõe de forma mais brutal sobre os indivíduos.
LABIRINTO RETÓRICO – O Ministério Público Federal apresentou recentemente uma denúncia que, sob o pretexto de proteger a democracia, constrói um labirinto retórico onde qualquer questionamento ao sistema eleitoral é automaticamente transformado em prova de conspiração criminosa.
Se há um mérito no documento, é demonstrar como a lógica pode ser manipulada para servir a uma narrativa previamente estabelecida, na qual a culpa precede a evidência, e a acusação já nasce como condenação.
Nesse caso, a denúncia começa pelo veredito e depois sai em busca de justificativas para sustentá-lo. Em vez de uma exposição rigorosa dos fatos, ela impõe uma moldura e encaixa os elementos conforme necessário, sem espaço para contradições ou nuances.
FATO CONSUMADO – O texto inicia com uma afirmação categórica: a existência de uma organização criminosa voltada para sabotar o Estado Democrático de Direito. No entanto, essa premissa não é demonstrada, apenas declarada, e, a partir dela, toda a argumentação se desenvolve como se fosse um fato consumado.
Essa estratégia, conhecida como petitio principii ou petição de princípio, é um truque clássico: em vez de provar que havia uma conspiração, a denúncia já a assume como verdadeira e molda os fatos para sustentá-la, ou seja, o famoso “é porque é”.
Além disso, o MPF apresenta uma visão binária dos acontecimentos: ou os denunciados aceitavam incondicionalmente o sistema eleitoral ou estavam envolvidos em um golpe.
FALSA DICOTOMIA – Essa falácia da falsa dicotomia exclui a possibilidade de um debate legítimo sobre o processo eleitoral, transformando qualquer crítica em subversão. Não há espaço para discordâncias legítimas, apenas para a submissão ou para a acusação de conspiração.
Outro erro fundamental é a confusão entre correlação e causalidade. O fato de alguns indivíduos expressarem descontentamento com o sistema eleitoral é apresentado como evidência de que integravam um plano golpista, como se ideias semelhantes não pudessem surgir de forma independente.
Se essa lógica fosse aplicada de maneira consistente, qualquer grupo que critique o governo, participe de reuniões ou faça discursos inflamados poderia ser acusado de conspiração criminosa.
SEM PROVAS – A peça acusatória se torna ainda mais frágil ao organizar os supostos conspiradores em uma estrutura hierárquica quase mística, como se todos estivessem perfeitamente sincronizados em um plano infalível. Mas essa estrutura é sustentada por suposições e conjecturas, não por provas concretas.
Há um esforço evidente em encaixar os fatos dentro do molde predefinido de uma organização criminosa, o que aproxima mais o documento de uma narrativa conspiratória do que de um trabalho jurídico sério.
O tom alarmista da denúncia, somado à repetição incessante dos eventos de 8 de janeiro como se fossem o ápice de um plano meticulosamente arquitetado, transforma o texto em um panfleto político.
SEM EVIDÊNCIAS – A todo momento, a invasão dos prédios dos Três Poderes é evocada para
fixar a ideia de que os denunciados são responsáveis, mesmo sem evidências diretas que os vinculem ao vandalismo daquele dia.
Além disso, a denúncia recorre ao viés de confirmação, selecionando falas e ações que reforcem a tese de conspiração e ignorando qualquer elemento que possa contradizê-la.
A argumentação parte da premissa de que qualquer frase crítica ao sistema eleitoral foi dita com intenções golpistas, sem levar em conta o direito à liberdade de expressão e à contestação política, ambos protegidos pela Constituição.
VIÉS AUTORITÁRIO – O aspecto mais revelador da denúncia talvez seja sua insistência na tese de que questionar a legitimidade do processo eleitoral teria sido uma preparação psicológica para um golpe.
Esse tipo de raciocínio reflete viés autoritário: o que deveria ser debatido se torna um crime, e o que se criminaliza já nasce condenado.
A peça tenta transformar o direito à crítica em delito, colocando sob suspeita qualquer um que tenha ousado discordar. Mas o problema vai além das falácias lógicas e da retórica inflamada. O enquadramento jurídico adotado pelo MPF tem falhas graves.
SEM ATOS CONCRETOS – Os crimes imputados – abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do CP), tentativa de depor governo legitimamente eleito (art. 359-M do CP) e organização criminosa (Lei 12.850/2013) – exigem atos concretos e eficazes de execução, mas a peça se baseia apenas em discursos políticos e conjecturas sobre intenções.
Para configurar o crime de abolição violenta, é necessário o emprego de violência ou grave ameaça, algo que simplesmente não se verifica no caso.
Da mesma forma, a tentativa de golpe exige o início de atos executórios, o que não ocorreu. O enquadramento na Lei das Organizações Criminosas também se mostra forçado, pois não há estrutura hierárquica estável voltada à prática de crimes, apenas articulações políticas dentro dos limites democráticos.
EXAGERO PENAL – Além disso, responsabilizar os acusados pelos atos de vandalismo de 8 de janeiro sem uma prova concreta de que ordenaram ou facilitaram tais crimes viola o princípio da responsabilidade penal individualizada.
O resultado é um uso expansivo e perigoso do Direito Penal para criminalizar dissidências políticas, criando um precedente em que a retórica se sobrepõe aos limites legais.
No fim, o que temos não é uma acusação juridicamente sólida, mas um exercício retórico de manipulação lógica e emocional.
MANIPULAÇÃO – O texto não busca provar um crime, mas sim construir uma narrativa em que a culpa já está previamente decidida, e os fatos são encaixados para sustentá-la.
Os membros do Ministério Público, ao assumirem seus cargos, juraram defender a Constituição, que protege a liberdade de expressão — inclusive quando se trata de ideias impopulares ou até mesmo absurdas.
O Direito Penal, mais do que tudo, deve se preocupar com condutas criminosas, não com opiniões ou divergências políticas.
SUFOCAR O DEBATE – O verdadeiro atentado à democracia não é a liberdade de expressão ou a contestação política, mas sim a tentativa de sufocar o debate e transformar discordância em delito.
Como bem apontado em editorial do Estadão de hoje, foi o próprio ministro Barroso quem, ao se colocar pessoalmente como um dos responsáveis por “derrotar o bolsonarismo”, contribuiu para alimentar a desconfiança sobre a imparcialidade institucional.
Quando juízes assumem ares de militância, o senso de justiça dá lugar à polarização, e os tribunais, que deveriam pacificar conflitos, tornam-se palco de disputas políticas. Se esse processo continuar nesse rumo — iniciado por uma denúncia circense —, estaremos diante de um julgamento digno de Alice no País das Maravilhas – onde a sentença vem antes do veredito, e a rainha brada “Cortem-lhe a cabeça!” antes que o julgamento sequer comece.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Um artigo de máxima importância, enviado por Mário Assis Causanilhas. Mostra que ainda há juristas no Brasil e que a denúncia do procurador Paulo Gonet é uma comprovação da fase sinistra que a Ciência do Direito atravessa no Brasil. (C.N.)
Verdades seletivas e pervertidas. “Gilmar Mendes diz que Lava Jato praticou tortura: “pervertidos”.
O ministro defendeu a instauração de inquérito para apurar os métodos usados pela força-tarefa de Curitiba.
“Na sessão da 2ª turma do STF desta terça-feira, 9, o ministro Gilmar Mendes defendeu a instauração de inquérito para apurar os métodos usados pela força-tarefa da Lava Jato e disse que a operação praticava “tortura”.” (Migalhas, 10.05.2023)
“Teria que ter inquérito para saber o que se passou. As pessoas só eram soltas, liberadas, depois de confessarem e fazerem acordo. Isso é uma vergonha e nós não podemos ter esse tipo de ônus. Coisa de pervertidos. Claramente se tratava de prática de tortura usando o poder do Estado.” (Migalhas, 10.05.2023)
Gilmar e Toffoli criticam Lava Jato no STF: “Tortura” e “pau de arara do século 21”
Segunda Turma da Suprema Corte derrubou proibição de condenado pela operação de deixar o País. (Lucas Mendes, CNN, Brasília, 09.05.2023)
Fontes:
https://www.migalhas.com.br/quentes/386230/gilmar-mendes-diz-que-lava-jato-praticou-tortura–pervertidos
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/gilmar-e-toffoli-criticam-lava-jato-no-stf-tortura-e-pau-de-arara-do-seculo-21/
TI segue imbatível na defesa de Bozo
Argghhhh!
Contestar a lógica usando artifícios políticos é pura militância ideológica.
O ilustre articulista ataca reiteradamente a suposta retórica que teria alicerçado a denúncia, mas faz uso dela, umas vezes despudorada e outras subliminarmente, em todo seu artigo.
Desconfio que esteja tudo perdido, a direitona sequestrou até a lógica, além das volúveis e débeis mentes patrícias.
Somente após ter sido condenado, amigo José Carlos.
Abs.
CN