Mario Sabino
Metrópoles
A caça ao senador Sergio Moro segue implacável. Ter desbaratado, como juiz da Lava Jato, uma organização criminosa no topo da cadeia alimentar da política brasileira é pecado mortal. Ele vem sendo castigado também para dar exemplo: que ninguém ouse mais enfrentar a grande corrupção e o patrimonialismo.
Dito isso, Sergio Moro é um desastre como político, não pelas bandeiras que defende, mas por sua atuação em um meio que lhe é quase totalmente hostil. A sua maior culpa é a ingenuidade, e por vezes ingenuidade que se acha esperteza, o que o faz duplamente ingênuo. Isso facilita muito o trabalho dos caçadores.
CONTRADIÇÕES – Ele saiu do Ministério da Justiça atirando contra Jair Bolsonaro, mas entrou de cabeça na campanha do seu algoz, depois de protagonizar uma confusão ao mudar de partido, de estado e da candidatura presidencial para a senatorial.
A confusão poderia ter sido evitada se ele tivesse examinado melhor o quadro partidário e não houvesse confiado em gente inconfiável. Resultado: as sequelas do episódio estão na base do pedido de cassação do mandato de Sergio Moro.
O desastre como político também está nas companhias que escolheu, como a desse amigo advogado que recebeu dinheiro de campanha, embora não seja especializado em direito eleitoral.
PEDIDO DE CASSAÇÃO – Não dá para ter amigo advogado recebendo dinheiro de campanha, mesmo que ele reunisse todos os atributos que o tornassem o melhor profissional do país para assessorar qualquer candidato. Obviamente, o Ministério Público Eleitoral explora o personagem no seu pedido de cassação.
Outra companhia que cria um ambiente de suspeição: esse inefável Mestrão, que surgiu para a posteridade trocando mensagens com Sergio Moro durante a sabatina de Flávio Dino, É um sujeito complicado. Mestrão foi contratado para cuidar das redes sociais do senador, apesar de ter sido acusado de fazer rachadinha quando trabalhava no gabinete de um deputado estadual do Paraná.
É o mesmo estado de Sergio Moro, de onde se pode concluir que o histórico do rapaz já devia ser do conhecimento do senador e dos seus assessores. Mesmo assim, ele foi integrado à equipe. Como é que alguém que, além de ser honesto, precisa desesperadamente parecer honesto não antecipou que o sujeito era um problema?
ABRAÇO AFETUOSO – Sabatina. O abraço afetuoso em Flávio Dino, acompanhado de conversinha ao pé do ouvido e sorrisos quase amorosos: precisava? Concordo com Sergio Moro que a cordialidade é aspecto a ser preservado, mas aquilo foi demonstração que ultrapassou os limites toleráveis pelo eleitorado dele.
O senador e o agora ministro do STF jogavam juntos na arena corporativa, quando ambos eram juízes, de acordo com fonte confiável. Pode ser, então, que certa nostalgia amigável tenha tomado Sergio Moro ao ir cumprimentar Flávio Dino. Mas, por cálculo político, o passado de glórias não deveria sobrepor-se ao presente de antípodas.
Esse abraço afetuoso somado à brandura das perguntas afáveis na sabatina, ao voto que Sergio Moro mantém secreto, “para evitar retaliações”, e à mensagem de Mestrão captada pela lente de um fotojornalista (como é que o senador não imaginou que poderiam fotografar a conversa, diante de tantos precedentes?) — o conjunto leva a pensar que Sergio Moro foi a favor da nomeação de Flávio Dino para o STF, perdendo, assim, boa parte do seu eleitorado.
QUAL O MOTIVO? – Se tal é o caso, qual teria sido o motivo? Se o senador acha que, em retribuição, o agora ministro do Supremo moverá meia palha para salvá-lo da degola, ele está sendo ingênuo novamente. A retaliação está em andamento. O senador é o inimigo figadal, renal, cerebral e cardíaco de Lula. Tudo o que o atual presidente quer é ver quem o colocou na cadeia sendo cassado, sem direitos políticos por 8 anos, além de preso, se for possível.
Uma explicação possível para a atitude de Sergio Moro na sabatina é ele ter ouvido a sugestão de um ministro do STF para pegar leve com Flávio Dino e, em troca, quem sabe, receber uma facilidade na Justiça Eleitoral que impedisse a cassação do seu mandato.
É uma aposta arriscadíssima no resultado — e, se der certo, ela comporta um custo que certamente não se restringirá ao da sabatina. As faturas em Brasília são cobradas eternamente dos ingênuos.