Vicente Limongi Netto
Em mensagem que me encaminhou nesta semana, o jornalista, escritor, cronista e crítico cinematográfico Ignácio de Loyola Brandão, entra no debate sobre o colunismo social no Brasil, cujos principais nomes foram Maneco Müller, que escrevia sob pseudônimo de Jacinto de Thormes, em homenagem a um personagem de Eça de Queiroz, e seu seguidor no estilo, Ibrahim Sued.
Neste primoroso texto, Loyola Brandão, que é membro da Academia Brasileira de Letras nos dá uma aula sobre esse capítulo da história da Imprensa brasileira.
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EU, JACINTO DE THORMES E IBRAHIM SUED
Ignácio de Loyola Brandão
Tive oportunidade de ser amigo pessoal do Jacinto de Thormes, isto é, de Manuel Bernardes Müller. Em certo momento, em seus últimos anos de vida, ele e eu fizemos juntos uma bela edição especial da revista Vogue, (da qual fui editor) sobre Carmem Mayrink Veiga.
E ela – Carmem, do alto de suas seguidas consagrações nas listas das mais elegantes e locomotivas sociais do Rio (quanta frescura…), me contou como Maneco mandava, comandava, regia a sociedade, pontificando do alto de sua coluna.
E lembro dele no final da vida como tranquilo na sua obscuridade. esquecido por todos que ele tinha tornado célebres. Um homem digno e simples no final da vida. Apesar de ser um os raros plebeus que cochichou aos ouvidos da rainha Elizabeth, sentado ao lado dela no Maracanã e traduzindo as manifestações da torcida, que a encantaram, numa sensacional partida entre Rio e São Paulo, como Pelé e Gérson em campo.
FUI AO GOOGLE – Para falar sobre o famoso Jacinto de Thormes, nem precisei consultar o trabalho clássico de Nelson Werneck Sodré sobre a história da imprensa brasileira. Fui ao Google, mesmo.
Existe muito material sobre os dois homens que criaram o moderno colunismo social. Há semelhanças e diferenças. Mas fica demonstrado como Ibrahim foi na onda revolucionária do Jacinto, que trouxe para ele os atalhos.
Jacinto de Thormes, pseudônimo de Maneco Müller, filho de um diplomata brasileiro e homem de estudos e cultura, nascido em 1923, um ano antes de Ibrahim, começou a trabalhar em 1943 na “Folha Carioca” (Depois “Diario Carioca”) , tendo provocado uma revolução no colunismo.
NOTAS SOCIAIS – Até então, esse tipo de jornalismo era feito de notas sociais, nascimentos, aniversários, batizados, casamentos, etc. Maneco Müller foi um assombro.
Ele espantou os jornalistas, porque mudou tudo, baseado nos colunistas americanos do The New York Times e do Washington Post, que misturavam sociais com política, economia, arte, cultura, e também potins, ou fofocas, mexericos, etc. Enfim, abrangia todos segmentos da sociedade.
Aumentou a extensão dos interesses, modificou, eliminou a mesmice, o rotineiro. E de repente, aquele canto de página esquecido, desprezado e chato, ganhou força, com uma repercussão incrível.
FORÇA IMENSA – A crônica começou a ter força, muitas vezes uma nota política ou econômica virava manchete do jornal. Jacinto tornou-se um personagem único, admirado, bajulado, invejado, o grande astro da mídia. Mas também era atacado, como acontece com toda celebridade.
Ibrahim Sued teve uma trajetória diferente, porque veio de uma família de imigrantes, não teve a chance de adquirir profundidade cultural. Começou no jornalismo como fotógrafo, mas conseguiu convencer Roberto Marinho a lhe dar um espaço cultural no segundo caderno.
No início, era humilhado, desprezado, mas contratou jornalistas talentosos para auxiliá-lo na coluna e assim se tornar poderoso e virou uma celebridade como Jacinto de Thormes, que havia abandonado o colunismo social e passara a trabalhar no jornalismo esportivo na Ultima Hora, escrevendo crônicas diárias sobre futebol.
MESMA FÓRMULA – Ibrahim recebeu a fórmula do Jacinto e a usou. Aprendeu com ele a criar termos novos, a fazer lista de mais elegantes, inclusive homens. Arranjou informantes de alta categoria. Criou até bordões de linguagem.
Sua coluna começou em 1954 no “Globo”. Portanto, começou onze anos depois do Maneco Müller, que lhe abriu o caminho. Ibrahim aplainou a estrada, recebeu um público específico e diversificado. Tornou-se tão importante quanto seu precursor. Mas o formato já tinha sido montado, explorado e preparado o público. Ibrahim recebeu de mão beijada. Essa a diferença. Mas isso não diminui em nada Ibrahim Sued, pois ele simplesmente seguiu a mesma trilha de Maneco Müller, com o mesmo sucesso.
Quanto a Jacinto de Thormes, voltou a pertencer à obra eterna de Eça de Queiroz, “A Cidade e as Serras”.