Depois de superado o golpismo, é preciso impor limites severos ao Supremo

Juízes auxiliares do STF ganham mais que os ministros da corte - Espaço  Vital

Charge do Alpino (Yahoo Notícias)

Malu Gaspar
O Globo

A prisão definitiva de Jair Bolsonaro e dos generais da trama golpista é prova da força da nossa democracia. Derrotou-se o golpismo há décadas latente na caserna, e pela primeira vez na História puniram-se os chefes de um complô por ruptura institucional. Está posto que, no Brasil, atentar contra o regime democrático pode sair muito caro. Mas o ciclo que se encerra com essas prisões também prova que a depuração democrática é uma tarefa que nunca termina. E não estará completa sem uma revisão profunda do papel do Judiciário.

Uma das ideias que passaram a ser repetidas nos últimos dias é que, findo o julgamento, está na hora de o Supremo voltar para seu quadrado, ser mais contido, exercer mais comedimento. Embutido no raciocínio está o reconhecimento de que o tribunal, Alexandre de Moraes em especial, foi além de suas atribuições em vários momentos — e tudo bem, porque foi por “boa causa”, mas agora chega.

EXCESSOS REAIS – O debate sobre até onde Moraes e o Supremo falharam é importante e ainda durará algum tempo. Decisões monocráticas e de ofício, sem ouvir previamente o Ministério Público, prisões preventivas por meses sem acusação formal, a morte na cadeia de um réu que poderia ter ido para casa de tornozeleira, a manobra que transferiu à turma e tirou do plenário o julgamento do ex-presidente serão sempre apontadas como máculas no processo.

Há ainda fios soltos a puxar se porventura mudar o contexto político e jurídico, abrindo espaço para tentar anular o caso — como se fez na Lava-Jato com sucesso. Há até uma versão golpista da Vaza-Jato, com mensagens nada abonadoras para Moraes. Os excessos dele, porém, não tornam menos concreto o golpismo de Bolsonaro, da mesma forma que os desvios de Moro não apagaram a corrupção revelada pela Lava-Jato.

O que deveria preocupar é o que o Supremo fez com o salvo-conduto recebido. O inquérito das fake news, ou “do fim do mundo”, é simbólico. Foi aberto em 2019 por Dias Toffoli, inconformado com uma reportagem a respeito da investigação da Receita Federal sobre sua mulher e a de Gilmar Mendes, ambas advogadas. Toffoli entregou a investigação a Moraes, sem sorteio e contra a Procuradoria-Geral da República, que defendeu o arquivamento.

NADA A VER – Na origem, portanto, nada tinha a ver com Bolsonaro. Com o passar do tempo, Moraes deixou para trás a história da reportagem e mudou o foco para apurar a disseminação de fake news por bolsonaristas. Por isso, muita gente bateu palmas. Sempre que pode, Gilmar faz questão de dizer que, sem o inquérito das fake news, o Brasil poderia ter virado uma ditadura.

Vitaminado pelo combate ao golpismo, em agosto de 2023 os ministros também mudaram as regras para permitir que juízes de todo o país pudessem atuar em processos dos escritórios de advocacia de seus parentes, um liberou geral para a promiscuidade no Judiciário. Considerando que ao menos sete dos 11 ministros têm parentes em escritórios que cobram fortunas para representar interesses junto ao Supremo, foi uma decisão em causa própria, que numa canetada jogou por terra noções de republicanismo vigentes no mundo todo. Quem criticasse, porém, era implicante — ou pior, golpista.

Eis que o processo do golpe está no fim e o escândalo do momento é do Banco Master — de acordo com MP e PF, nos últimos anos uma fábrica de fraudes que enganou mais de 1 milhão de investidores, além de drenar dezenas de bilhões de reais e a credibilidade do sistema financeiro.

CASO MASTER – Uma das principais razões de o esquema durar tanto tempo foi a blindagem política e jurídica do Master, que financiava variantes do Gilmarpalooza no Brasil e no exterior. Entre as estrelas desses eventos estavam Gilmar, Toffoli, Luís Roberto Barroso e Moraes. No balanço de 2024, o Master informou ter gastado mais de R$ 260 milhões com consultorias e advogados. Inclui-se aí a mulher de Moraes, Viviane Barci, agraciada com um contrato.

Dadas as relações do dono do Master, Daniel Vorcaro, com políticos de diferentes calibres, não será surpresa o caso acabar no Supremo. Nessa hora, que farão esses ministros? A prisão de Bolsonaro e companhia foi histórica, mas o golpismo não é o único fator capaz de minar uma democracia. Sem a garantia de que as instituições servem unicamente ao interesse público e de que nenhum juiz está acima da lei, ela se enfraquece um pouquinho a cada dia.

Protegidos pela capa de “heróis da democracia”, os supremos magistrados foram aos poucos derrubando os controles para se tornar intocáveis. Claro que mais comedimento seria muito bem-vindo, mas acreditar que isso ocorrerá sem custo equivaleria a comprar, a esta altura, um CDB do Master.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Excelente artigo. Mas é preciso fazer ao menos um reparo. O fato de ser por foi por “boa causa” não pode servir de justificativa para erros e exageros propositais dos ministros, porque isso é sintoma de ditadura. Na democracia, a lei tem de ser igual para todos. (C.N.)

7 thoughts on “Depois de superado o golpismo, é preciso impor limites severos ao Supremo

  1. Todos esses episódios mencionados pela jornalista — entre tantos outros convenientemente ignorados por seus pares — não seriam, em qualquer democracia minimamente funcional, motivos mais do que suficientes para a revisão de processos, declaração de suspeição, abertura de investigações e eventual responsabilização de membros do Judiciário?
    Mas quem, afinal, dispõe de cacife político e institucional para peitar os pretorianos togados da corte suprema?

  2. Quanto descaramento. Após passar anos como a “rainha do completo” da facção de narcotraficantes PT-STF, a venal jornalista dá uma de Madalena arrependida.

  3. Como uma jornalista desse gabarito confessa, numa boa e sem constrangimentos, tamanha agressão a leis ordinárias e CF: “Depois de superado o golpismo, é preciso impor limites severos ao Supremo”.
    Golpismo?
    Estamos sem limites severos?

    Dona Malu Gaspar parece outra senhora que votou pela censura: “Não se pode permitir a volta de censura”, diz Cármen Lúcia ao comentar decisões do TSE em que apoiou ato de censura.

    CENSURA
    Censura é a supressão ou proibição da circulação de informações, ideias ou expressões artísticas consideradas inconvenientes ou perigosas.

    Aplicada por governos, organizações ou indivíduos e é frequentemente justificada pela proteção de interesses de estado, morais ou ideológicos.
    A Constituição do Brasil, proibe expressamente toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. A liberdade de expressão é um direito fundamental garantido pelo texto constitucional.

    AGORA CHEGA.
    OBJETIVOS ALCANÇADOS.
    CONFISSÃO
    “Uma das ideias que passaram a ser repetidas nos últimos dias é que, findo o julgamento, está na hora de o Supremo voltar para seu quadrado, ser mais contido, exercer mais comedimento. Embutido no raciocínio está o reconhecimento de que o tribunal, Alexandre de Moraes em especial, foi além de suas atribuições em vários momentos — e tudo bem, porque foi por “boa causa”, mas agora chega.”

    AGORA CHEGA. CONFISSÃO INACEITÁVEL NUMA DEMOCRACIA
    “EXCESSOS REAIS – O debate sobre até onde Moraes e o Supremo falharam é importante e ainda durará algum tempo. Decisões monocráticas e de ofício, sem ouvir previamente o Ministério Público, prisões preventivas por meses sem acusação formal, a morte na cadeia de um réu que poderia ter ido para casa de tornozeleira, a manobra que transferiu à turma e tirou do plenário o julgamento do ex-presidente serão sempre apontadas como máculas no processo.”

    IRONIAS NA CONCLUSÃO
    SOBRE BANCO MASTER PASSA LONGE…
    NUNCA FOI PELO PAÍS…
    “Protegidos pela capa de “heróis da democracia”, os supremos magistrados foram aos poucos derrubando os controles para se tornar intocáveis. Claro que mais comedimento seria muito bem-vindo, mas acreditar que isso ocorrerá sem custo equivaleria a comprar, a esta altura, um CDB do Master.”

    Curtinhas

    PS.: CENSOR FEDERAL
    Nem precisam mais recriar o cargo de Censor Federal. A mídia porca ou amestrada ou adestrada está cumprindo bem esse papel. A diferença é que precisa ser (e está sendo) muito bem remunerada.

    PS. 02: SE “BOLSONARO ACABOU”, como TENTAM COLOCAR, porque a ESQUERDA não CONSEGUE PARAR de FALAR DELE?

    PS. 03: GENERAL AUGUSTO HELENO – 78 ANOS – CONDECORADO MILITAR
    A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou, nesta sexta-feira (28), a favor da concessão de prisão domiciliar humanitária para o ex-ministro do GSI.
    Preso num golpe impossível onde uma das armas era baton e algodão doce.

    PS. 04: O BANCO MASTER
    O Banco Master, que negocia a venda de parte de sua operação para o BRB, o banco estatal de Brasília, contratou para representá-lo judicialmente o escritório Barci de Moraes, onde trabalham a mulher e dois filhos do ministro do Supremo Alexandre de Moraes.
    (Malu Gaspar – O Globo)

    PS. 05: LULA DECRETANDO SIGILOS
    Planalto coloca em sigilo gastança de Lula e Janja com barco de luxo em Belém
    Iate cinco estrelas tem diária de 2.700 reais por pessoa, segundo o governo informou sem apresentar o contrato e o valor total.

  4. O golpe está consumado
    https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/marcel-van-hattem/stf-golpe-esta-consumado/

    Quase três anos após a farsa do 8 de Janeiro de 2023, declarou-se nesta semana fim do processo no Supremo Tribunal Federal (STF) que levou Jair Bolsonaro à prisão. Como não poderia deixar de seguir o padrão de ilegalidade e abusos, também o encarceramento definitivo de Bolsonaro foi fundamentado em inconstitucionalidades – como a alegação de que uma vigília de oração convocada pelo filho pudesse significar risco à ordem pública, em clara afronta aos direitos de reunião e de liberdade religiosa – e o trânsito em julgado declarado sem garantia à defesa de todos os recursos que caberiam, se o devido processo legal fosse respeitado.

    As ilegalidades e abusos do Supremo, sob a liderança de Alexandre de Moraes, já não surpreendem mais. Anestesiado, o povo brasileiro assistiu aos estertores desse justiçamento promovido pelos algozes de Bolsonaro sem demonstrar grande reação. A anistia, ainda não apreciada no Congresso Nacional, tem defensores vocais e incansáveis, dentre os quais me incluo, mas já é tido como provável que seja substituída por uma redução de pena, alegando-se ser o único caminho possível para o momento.

    Não é à toa que jornalistas de grandes meios começam a se manifestar agora, consumado o golpe, para reconhecer os excessos do STF, justificá-los em nome de um ‘bem maior’ nas suas visões, e rogar para que o Supremo agora se contenha. Quanta inocência! Ou melhor: quanta confissão e culpa misturados com uma ingenuidade de dar pena – e calafrios

    Em síntese, o que fica claro é que o golpe já foi dado, a conta gotas, e agora está consumado. Não o golpe impossível do 8 de Janeiro, sem liderança, com pessoas desarmadas e sem participação de forças armadas em um domingo de recesso em Brasília, que não contava nem mesmo com a presença do presidente no Planalto. Da mesma forma, não o golpe – até mesmo cômico – envolvendo uma alegada tentativa de assassinato de altas autoridades que só não deu certo pela suposta falta de um taxi para que fosse executado. Nada disso.

    O golpe consumado foi dado pelo Supremo em todas as demais instituições brasileiras, submetendo-as ao seu arbítrio e subvertendo a ordem constitucional. O golpe que venho denunciando iniciou, de fato, a partir dos inquéritos inconstitucionais e sem fim abertos em 2019. Supostamente para combater fake news, ministros do STF e seus aliados utilizaram-se de um poder ilimitado e autoconcedido de investigação para perseguir adversários, censurar a direita, intimidar e cassar seus líderes eleitos e, finalmente, prender o maior líder popular da direita brasileira. Aos 70 anos e com saúde debilitada, não importa: a perversidade não observa limites. Jair Bolsonaro foi processado em foro inadequado, acusado com base em uma delação inconsistente e obtida sob coação. O relator de seu processo, Alexandre de Moraes, é também a suposta vítima no caso. Sua primeira prisão domiciliar, ilegal, transformou-se em cárcere privado. Sua prisão provisória e, depois, a definitiva, completamente inconstitucionais.

    A infame parcialidade dos seus julgadores – ou justiceiros – e a ausência de devido processo no caso de Bolsonaro e no de milhares de outros brasileiros hoje perseguidos políticos, só foi possível por conta da conivência de um ator fundamental: grande parte da imprensa brasileira, obviamente excetuados meios como esta Gazeta do Povo. Não é à toa que jornalistas de grandes meios começam a se manifestar agora, consumado o golpe, para reconhecer os excessos do STF, justificá-los em nome de um “bem maior” nas suas visões, e rogar para que o Supremo agora se contenha. Quanta inocência! Ou melhor: quanta confissão e culpa misturados com uma ingenuidade de dar pena – e calafrios.

    O gênio – ou demônio –, quando sai da garrafa, não volta mais. E golpistas, quando tomam o poder, não recuam mais. Enquanto uns foram condenados por suposta “tentativa de golpe”, outros – seus algozes –, foram dando, passo a passo, o verdadeiro golpe na nossa nação. O golpe do consórcio Lula-STF está consumado.

    Marcel van Hattem é deputado federal e líder do Partido Novo. Bacharel em Relações Internacionais, com especializações em Direito, Economia e Democracia Constitucional. Mestre em Ciência Política pela Universidade de Leiden e em Jornalismo pelas universidades de Aarhus e Amsterdã. Participou do Programa de Liderança Política, Social e Empresarial da Georgetown University, EUA.

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