Josias de Souza
do UOL
Perderam Lula e Bolsonaro. Ambos revelaram-se cabos eleitorais menores do que imaginavam. Ficaram mal a ultradireita e a esquerda. Ganharam a centro-direita (PSD e MDB) e a direita (PP e União Brasil). A rota que leva ao Planalto em 2026 passa pelo centro.
QUEM PERDEU 1 – Bolsonaro foi o grande perdedor de 2024. No primeiro turno, a derrota no Rio de Janeiro havia sido atenuada pela passagem de bolsonaristas de mostruário para a fase final. No tira-teima, a maioria dos queridinhos do capitão naufragou.
Bolsonaro perdeu em Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia, Palmas, Fortaleza, João Pessoa, Manaus e Belém e Porto Velho. Em São Paulo, até Silas Malafaia notou a covardia do mito: “Porcaria de líder”, definiu o pastor.
O conservadorismo que prevaleceu nas urnas municipais não se confunde com o bolsonarismo. O capitão logo será matéria prima de sentenças.
QUEM PERDEU 2 – Lula nacionalizou a eleição mais importante, em São Paulo, ao dizer que seria uma disputa entre ele e a “figura”. Bolsonaro fugiu da briga. Lula virou sócio da derrota de Guilherme Boulos. Restou um consolo. Lula tem nas suas mães o seu futuro e o de seus antagonistas.
Se chegar a 2026 com boa saúde e bom desempenho, fará de 2024 apenas uma memória triste. Nessa hipótese, Lula aprisionaria as ambições políticas de Tarcísio de Freitas dentro de São Paulo. Melhor um Palácio dos Bandeirantes na mão que um Planalto voando.
QUEM PERDEU 3 – O PT e os demais partidos de esquerda e centro-esquerda disputavam seis capitais no segundo turno. Perderam cinco. A vitória mais dolorida foi a de Guilherme Boulos, em São Paulo.
A única vitória, obtida pelo petista Evandro Leitão, em Fortaleza, não justifica a explosão de fogos. Com a máquina estadual a seu favor e o apoio de Lula, Leitão derrotou o protobolsonarista André Fernandes por míseros 11 mil votos. Foi a única capital conquistada pelo PT. No ranking dos partidos, ocupa a nona posição, com 252 prefeituras. Está atrás do moribundo PSDB (274).
QUEM PERDEU 4 – A ultradireita teve o protagonista de 2024, Pablo Marçal, e mostrou que o bolsonarismo não é escravo de Bolsonaro, podendo aderir a outras opções de desqualificação.
Marçal nacionalizou sua baixaria. Armado das redes socias, vendeu ilusões a religiosos, jovens e brasileiros que ralam à margem da CLT. Teria potencial para bagunçar o quintal da direita em 2026. Mas a opção pelo crime eleitoral fez dele um candidato favorito à inelebilidade.
Filhotes de Marçal mais reverentes a Bolsonaro colecionaram derrotas ao redor do país.
QUEM GANHOU 1 – Tarcísio de Freitas, chamado de “grande líder” por Ricardo Nunes. O governador de São Paulo não venceu apenas na capital. Associou-se a vitórias do seu partido e de aliados em 626 dos 645 municípios de São Paulo. Coisa de 97,5% das cidades do estado.
Pavimentou a reeleição ao Palácio dos Bandeirantes. Manteve-se, de resto, no primeiro lugar da fila de alternativas conservadoras para o Planalto.
Paradoxalmente, Tarcísio apequenou o próprio feito ao difundir, sem provas, que o PCC pedia votos para Guilherme Boulos desde as prisões. Sua pretensa moderação tem dificuldades para se entender com seu bolsonarismo.
QUEM GANHOU 2 – Gilberto Kassab, dono do PSD, tornou-se onipresente nos bastidores da política. Prevaleceu em praças como Rio, Curitiba e Belo Horizonte.
Na cidade de São Paulo, embarcou no bonde de Ricardo Nunes. É secretário de Governo de Tarcísio de Freitas e aliado de Lula, em cujo governo o PSD controla três ministérios.
Kassab está em toda parte. Impossível fazer política no Brasil sem esbarrar nele.
QUEM GANHOU 3 – O centro-direita e a direita também venceram. O PSD comandará o maior número de prefeituras (887), superando MDB (854), PP (747) e União Brasil (584). Partidos de centro-direita e de direita venceram em 20 capitais.
Consolidaram-se duas percepções: 1) O itinerário que leva ao Planalto em 2026 passa pelo centro. 2) O próximo Congresso será feito de mais do mesmo.
Mais emendas, fisiologismo e emendas orçamentárias, com o mesmo viés conservador.
QUEM GANHOU 4 – Um dos grandes vitoriosos da eleição municipal foi o saco cheio nacional. O desalento do eleitorado foi dimensionado por uma taxa de abstenção de 29,26%. É praticamente o mesmo percentual registrado em 2020 (29,53%), em plena pandemia.
Em São Paulo, a taxa que mede os eleitores ausentes às urnas de 2024 foi de 31,64%, superior aos 30,81% registrados há quatro anos.
Os atores da polarização precisam prestar atenção a esse pedaço do eleitorado que se sente desatendido pela democracia. Para qualquer candidato, a chegada ao Planalto passa pelo Planalto.