Demissão de ministro por “foro íntimo” não é ato republicano nem democrático

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“Foro íntimo” jamais pode ser justificativa de ato presidencial

Jorge Béja

O porta-voz da presidência da República, Otávio Rego Barros, em curta entrevista coletiva no final desta segunda-feira, anunciou que o presidente Jair Bolsonaro demitiu o ministro-chefe, Gustavo Bebianno, da Secretaria-Geral da Presidência da República, por motivo “de foro íntimo”. E não deu mais explicações, mesmo encurralado pelos jornalistas presentes.

Não, há algo de muito errado. Somente aos magistrados é dado o direito de se escusar a decidir processo que preside por motivo “de foro íntimo”.

DIZ O CÓDIGO – Está no Código de Processo Civil. E o magistrado – diz a lei – não fica obrigado a esclarecer e revelar aquele motivo que tocou seu “foro íntimo” a ponto de passar o processo a seu substituto ou ao chamado juiz tabelar, que é o da vara seguinte à sua.

Mas não é republicano nem muito menos democrático um presidente da República demitir um de seus ministros e dizer que foi por “foro íntimo”. No exercício da presidência da República o presidente não tem “foro íntimo”. Seu foro, seu interior, seu íntimo, desde que no exercício do cargo, são coletivos, são de todos e ao povo pertencem.

SEM MOTIVOS – Os atos do presidente da República precisam ser motivados, fundamentados, explicados e reveladas as razões que o levaram a praticá-lo, porque no chefe do governo todos nós estamos encarnados e ele a todos nós representa.

E a também curta gravação que o presidente Bolsonaro acabou de divulgar pelas redes sociais não preencheu a lacuna de externar o “foro íntimo” que o levou a demitir seu ministro. Bolsonaro foi superficial, vazio, e o povo brasileiro tem o direito de saber toda a verdade. Era isso que se esperava dele.

Cartas embaralhadas

(Arquivo do Google)

Aécio Neves, Geraldo Alckmin e José Serra não penduraram as chuteiras, mas estão fora de campo. É possível que se componham, mas não mais em torno da candidatura de um deles, como se planejava. Não há tertius entre os três, mas por que não um quartus? No caso, João Dória Júnior, que já não nega com tanta ênfase a possibilidade.

O PSDB tem consciência de permanecer uma força partidária expressiva, em especial porque o PMDB continua, e mais continuará, sem candidato. Quanto ao PT, se perder o Lula para o juiz Sérgio Moro, dará adeus ao sonho de voltar ao palácio do Planalto. A operação Lava Jato embaralhou as cartas e faz emergir uma série de pretendentes sem partido, ou quase isso, tipo Ciro Gomes, Marina Silva, Jair Bolsonaro, Álvaro Dias, Joaquim Barbosa, Ronaldo Caiado e outros.

NÃO DÁ MAIS – Dentro do quadro partidário, porém, os tucanos estão no jogo. Só que com Aécio, Alckmin e Serra não dá mais. Por isso eles poderiam apoiar o atual prefeito de São Paulo.

Meirelles seria ideal para o PMDB, se sua política econômica desse certo, mas como parece cada dia mais difícil, o ministro da Fazenda fica no banco. Só entrará no gramado caso consiga conquistar o meio campo. Traduzindo: aguarda um milagre. Em suma, assim podem ser imaginadas as preliminares da sucessão de 2018, ainda que as cartas se encontrem embaralhadas. Acresce que o curinga não apareceu. Poderá surpreender.

O professor de grego

Uma velha, hilária e edificante história cearense

Sebastião Nery

Faustino de Albuquerque era Promotor no interior do Ceará.  Um amigo deu-lhe o filho para batizar e ainda pôs o nome dele no menino. Depois, Faustino foi juiz, desembargador, presidente do Tribunal de Justiça e acabou governador. Uma tarde, entra no palácio o afilhado Faustino de Albuquerque Silva com uma carta do compadre pedindo um emprego para o filho. Não havia vagas. A muito custo, o governador descobriu uma de professor de grego. Nomeou Faustino de Albuquerque Silva.

– Mas, padrinho, eu não sei grego.

– Não precisa saber, porque não há aluno de grego. Vá embora e não me crie problemas.

Todo fim de mês, Faustino de Albuquerque Silva passava no Liceu, recebia seu ordenado de professor de grego. Até que apareceu um ex seminarista muito piedoso, muito estudioso, querendo estudar grego. O afilhado correu ao palácio:

– Padrinho, me demita que apareceu um aluno de grego.

– Vá embora e não me crie problemas.

No fim do mês, Faustino de Albuquerque Silva foi ao Liceu receber o ordenado, procurou o diretor:

– Onde está o ex seminarista que queria estudar grego?

– Não sei. Aconteceu uma coisa horrível com ele. Era tão bonzinho, tão piedoso, tão estudioso, andava na biblioteca estudando, veio a polícia, levou. E nunca mais ele apareceu.

FAZENDO JUSTIÇA –  O primeiro ministro da Fazenda do Brasil era corrupto. O primeiro ministro da Justiça do Brasil era corrupto. O governador – geral Tomé de Souza, nomeado pelo rei de Portugal, desembarcou em Salvador em 1549, instalando a primeira capital do Brasil. Os dois principais colaboradores do nascente poder colonial eram fidalgos portugueses com prestígio na corte de Lisboa. O primeiro, Antonio Cardoso de Barros,  “Provedor-mor”, responsável pela arrecadação de impostos. O segundo, Pero Borges, “Ouvidor-mor”,administrava a justiça.Roubaram muito,ficaram riquíssimos

Pedro Borges, não veio por vontade própria. Havia sido condenado pela justiça portuguesa por ato de corrupção. Motivo: administrador  da obra, desviara parte do dinheiro destinado à construção do aqueduto de Mafra, cidade próxima a Lisboa. Ao invés da prisão, as relações familiares de prestígio na Casa Real negociaram sua vinda ao Brasil.

Antonio Cardoso de Barros seria o administrador das finanças públicas e gestor da economia. Sua missão: arranjar recursos para a construção da cidade de Salvador e áreas do Recôncavo baiano. Era de fato o ministro da Fazenda, tributando com rigor os poucos engenhos de açúcar existentes. Partes dos recursos eram incorporadas ao seu patrimônio pessoal. Ficou milionário, tornando-se proprietário de engenhos açucareiros, acumulando poder e fortuna. Era o tiro de largada na “roubalheira” do patrimônio público no Brasil.

BOLÍVAR E MURILO –  Cinco séculos depois, 2014, o professor e cientista político Bolívar Lamounier, no livro “A Cultura da Transgressão no Brasil”, afirma:

– “O Brasil é essencialmente corrupto e precisamos encarar isso. É falso que a elite é ruim mas o povo é essencialmente bom. Essa impressão é profundamente artificial.”

O professor José Murilo de Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, traduziu essa realidade:

– “Há uma cultura generalizada de transgressão que afeta as classes sociais, de alto a baixo. Furtam o político, o empresário, alguns magistrados, de um lado. Furtam, do outro, o profissional liberal, o policial, o trabalhador informal. Tal cultura tem a ver com valores e instituições. O valor republicano de respeito à lei e à coisa pública não existe.”

HELIO –  O professor Helio Duque, doutor em economia pela Unesp, adverte:

– “Nos próximos meses o Brasil viverá crise institucional de gravidade inédita. A cassação de mandatos será consequência das delações feitas pelo ex-diretor da estatal e pelo doleiro lavador das fortunas desviadas da roubalheira da Petrobrás. Foram mais de dez anos (governos Lula e Dilma) de assalto para favorecer “larápios políticos” investidos de funções públicas. Daí ser fácil entender porque nas recentes CPIS sobre a Petrobrás. a maioria governista sempre foi contra investigações sérias”. Não adianta nem ensinar grego. O trovão “Sergio Moro” vem ai.