William Waack
Estadão
Lula 3 caminha para ser o governo coração de mãe, onde sempre cabe mais um. No caso, mais um partido numa mega composição governista em linha com a essência da política brasileira: a acomodação dos mais variados interesses privados e setoriais via cofres públicos.
Essa fórmula de amplo espectro nada tem a ver com um “pacto” ou uma “concertación” nacional diante de crises ou desafios importantes para o País. Ela espelha uma enorme dispersão de projetos, impulsos, problemas a serem resolvidos e linhas de atuação, sem uma clara direção central.
SALADA INÚTIL – Lula 3 quer gastar mais sem tributar mais, reindustrializar via Estado sem ter recursos suficientes, corrigir distorções sem mexer nelas, atender a interesses contraditórios (como na transição energética) sem antagonizar nenhum. As negociações com o Centrão expressam exatamente essa salada de linhas de atuação, sem que se possa esperar o “triunfo” decisivo de qualquer uma delas (incluindo as do PT).
Em linhas gerais, é o resultado permitido pelo sistema político brasileiro. Medido pela capacidade de gerar crescimento e prosperidade, esse sistema merece uma péssima nota.
O Brasil exibe produtividade estagnada há décadas e renda per capita na mesma distância em relação às economias avançadas há uns 40 anos.
É IMPOSSÍVEL MUDAR – Embutido nesse sistema político, o sistema de governo na prática impede qualquer “atuação transformadora”. Nesse sentido, Lula 3 e seus arranjos de governabilidade são um retrato nítido da incapacidade geral das instâncias políticas no Brasil de romper a paralisia e encontrar impulsos convergentes em torno de estratégias mais ou menos definidas.
Mas sobra distração política, e não se trata apenas da persistente polarização das bolhas e seus “fatos” políticos que só os adeptos de cada lado reconhecem. As demoradas tratativas para a distribuição de pedaços do governo Lula 3 entre mais de uma dezena de partidos sugerem que dessas minuciosas negociações sairia algo “decisivo” ou “definidor” por um bom tempo.
PARA QUÊ? – Essa ilusão se desfaz, porém, bastando perguntar “para quê?” Para que o partido “x” pretende o ministério “y”? Para que o partido “z” almeja os cargos de autarquias e estatais? A resposta é óbvia e não se trata necessariamente da oportunidade de praticar ilícitos.
Essas agremiações apelidadas de partidos consideram que participar de governos é o que garante em primeiro lugar a própria sobrevivência.
Esses acertos de participação e apoio em geral não envolvem discussões sobre ideias, plataformas, projetos ou políticas públicas. Por isso é sempre tão fácil achar lugar para mais um.