Toffoli não tem preparo nem isenção para estar no Supremo
Rafael Moraes Moura
O Globo
A Petros, fundo de pensão dos trabalhadores da Petrobras, protocolou no Supremo Tribunal Federal um recurso em que acusa a J&F de omitir informações e apresentar uma narrativa “repleta de contradições e falsidades”, com o “claro intuito” de induzir a erro o ministro Dias Toffoli.
Em dezembro do ano passado, Toffoli atendeu a um pedido da J&F e suspendeu os pagamentos da multa de R$ 10,3 bilhões prevista no acordo de leniência fechado pelo grupo dos irmãos Joesley e Wesley Batista em 2017.
FUNDOS DE PENSÃO – Dos R$ 10,3 bilhões do acordo de leniência, a previsão era a de que R$ 1,75 bilhão fosse destinado à Petros ao longo de um prazo de 25 anos — o fundo alega ter recebido cerca de R$ 133 milhões até hoje.
Outro R$ 1,75 bilhão seria destinado à Funcef, o fundo de previdência dos empregados da Caixa, que também deixa de receber os recursos com a suspensão da multa e já protocolou seu próprio recurso contra a decisão de Toffoli.
No recurso protocolado na sexta-feira passada, a Petros alega que a decisão de suspender a multa “se encontra eivada de vícios de fundamentação, certamente decorrentes da omissão de fatos e elementos relevantes por parte da J&F que induziram Sua Excelência a erro, impedindo-o de exercer o escorreito juízo de valor e dar o devido deslinde à controvérsia”.
DIZ A HOLDING – O grupo dos irmãos Batista alegou que fechou o acordo de R$ 10,3 bilhões “num período da história brasileira marcado pela violação generalizada de diversos direitos fundamentais, capitaneada pela atuação parcial e nitidamente persecutória de determinados agentes do Estado”.
O acordo que a companhia dos irmãos Batista contesta foi fechado em 2017 com os procuradores da Operação Greenfield, em Brasília, que investigou crimes de fraude e gestão temerária contra a Petros e o Funcef.
A companhia confessou um esquema que teria sido articulado entre 2009 e 2015, tendo como pano de fundo os aportes dos fundos de pensão no FIP Florestal, que tinha entre seus principais acionistas a J&F.
PELA SEGUNDA VEZ – A tentativa de suspender a multa via Supremo veio depois que a J&F viu naufragar as manobras capitaneadas pelo subprocurador Ronaldo Albo, aliado de Augusto Aras.
Em junho do ano passado, ao ser derrotado na 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, ele tentou sozinho dar um desconto de R$ 6,8 bilhões ao grupo. Mas o despacho de Albo acabou derrubado pelo Conselho Institucional do Ministério Público Federal (MPF) em setembro do ano passado, por 17 votos a 2.
NADA A VER – Só então a empresa mudou de estratégia e investiu em um atalho jurídico, pedindo a suspensão dos pagamentos bilionários no processo derivado de uma reclamação movida por Lula contra a 13ª Vara Federal de Curitiba, da Lava-Jato – que nada tem a ver, portanto, com o acordo de leniência da J&F.
No recurso, a Petros “relembra” Toffoli que o acordo de leniência da J&F foi fechado no âmbito da Operação Greenfield, “que não guarda qualquer relação com os desmandos realizados na Operação Lava-Jato”.
E prossegue: “Ou seja, (no caso da J&F) trata-se de outro foro (da Odebrecht), outros investigadores, outra operação e, em última análise, outra situação que não guardam qualquer relação com a Operação Lava-Jato. Não há, até o presente, quaisquer indícios ou elementos de prova que levem a crer que houve a contaminação da Operação Greenfield pelos abusos cometidos pelos agentes da referida força-tarefa paranaense e pelo juiz da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba”, escreveram os advogados do fundo de pensão.
DEBATE AMPO – “Até porque, em verdade, o que se verifica da situação da J&F é justamente o contrário: os termos do pacto firmado foram amplamente debatidos em um longo processo que se estendeu de fevereiro a maio de 2017, período no qual a empresa contou com a contínua orientação de seus advogados e economistas e foi capaz, inclusive, de negociar a redução do valor da multa e a dilatação do prazo de pagamento”, afirma o fundo de pensão.
A Petros também sustenta que o faturamento do grupo praticamente dobrou desde que o acordo de leniência foi fechado, saltando de R$ 183 bilhões para R$ 365 bilhões entre 2016 (um ano antes da celebração do acordo) e 2021.
E ainda aponta que a revisão dos termos do acordo de leniência de R$ 10,3 bilhões já é alvo de uma ação que tramita na 10ª Vara Federal de Brasília, onde a repactuação do valor bilionário da multa já foi negado.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Em tradução simultânea, Dias Toffoli fez papel feio ao defender os interesses de uma empresa que tem sua mulher, Roberta Andrade, como advogada sob contrato. É um vexame, um escândalo absurdo, mas nada vai acontecer a Toffoli nem aos irmãos Joesley e Wesley Batista, acostumados a subornar autoridades neste país. Com o Supremo desse jeito, o que se pode esperar do resto da Justiça? (C.N.)