INSS, fraudes e a responsabilidade política que ninguém quer assumir

A CPI do INSS e a tentativa do governo Lula de controlar os danos

Charge do Cláudio de Oliveira (folha.uol.com.br)

Pedro do Coutto

A instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a corrupção no INSS não é apenas um reflexo da indignação pública, mas uma imposição dos fatos. O escândalo envolvendo fraudes em descontos consignados de aposentados e pensionistas ultrapassou qualquer limite de tolerância — não apenas pela cifra astronômica (fala-se em 9 milhões de autorizações falsas), mas pela sensação de abandono institucional diante de um crime que se desenrolava à luz do dia.

Diante desse cenário, o governo Lula recuou de sua postura inicial de contenção e decidiu apoiar a CPI. Foi uma adesão forçada, mais por sobrevivência política do que por genuíno compromisso com a transparência. Afinal, seria politicamente insustentável se opor a uma investigação que já conta com farta documentação, denúncias confirmadas e cobertura extensa da imprensa.

ESCÂNDALO – A linha oficial do Planalto tenta empurrar a gênese da corrupção para o governo anterior, de Jair Bolsonaro. Ainda que as raízes do esquema possam, de fato, estar lá, é impossível ignorar que o escândalo atingiu proporções industriais justamente em 2024 — já sob a responsabilidade plena do atual governo. A alegação de “herança maldita” pode funcionar como argumento político, mas não resiste à análise administrativa: se o problema cresceu, foi porque não houve ação eficaz para detê-lo.

Mais grave ainda é a tentativa do governo de ocupar simultaneamente a presidência e a relatoria da CPI. Ao buscar o controle da comissão, o Planalto sinaliza que seu apoio à investigação é, na melhor das hipóteses, condicional. Trata-se de uma estratégia de contenção de danos, não de responsabilização. A relatoria, posição estratégica da CPI, terá a caneta que poderá dar nome aos bois — ou livrá-los discretamente. Por isso, a disputa por esse posto é um termômetro claro do quanto está em jogo.

A tentativa de concentrar poder dentro da comissão levanta suspeitas legítimas sobre a real disposição do governo em permitir que a investigação vá até as últimas consequências. A sociedade exige respostas. E não há mais espaço para o discurso do “não sabíamos”. As denúncias estavam disponíveis, os alertas foram dados, e as consequências agora pesam não apenas sobre os que operaram o esquema, mas também sobre aqueles que fecharam os olhos.

INTERFERÊNCIA – Ao apoiar a CPI, Lula tenta se desvincular do escândalo. Mas, ao mesmo tempo, busca interferir diretamente em sua condução. Essa contradição revela um dilema típico de quem governa em tempos de crise: ser investigado ou controlar a investigação? A escolha do Planalto parece estar clara — resta saber se o Congresso e a opinião pública aceitarão esse roteiro.

O Brasil assistirá, mais uma vez, ao embate entre discurso e prática, entre a retórica da apuração e o jogo de bastidores. O que está em julgamento não é apenas um esquema de corrupção. É a capacidade do Estado de zelar por seus mais vulneráveis — e de impedir que a máquina pública seja sequestrada pela impunidade.

INSS na mira: Quando o Estado falha com os que mais precisam

Charge do Jônatas (politicadinamica.com)

Pedro do Coutto

A revelação de que quase meio milhão de aposentados e pensionistas foram alvo de descontos indevidos em seus benefícios do INSS demonstra mais do que uma brecha explorada por entidades oportunistas — escancara a falência de mecanismos de controle dentro do próprio Estado. Quando 98,6% dos que se manifestaram dizem desconhecer qualquer vínculo com as associações que retiraram dinheiro de suas aposentadorias, não estamos falando de erro isolado. Trata-se de um esquema de larga escala, com traços de conivência estrutural.

O mais alarmante nessa operação conjunta da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União não é apenas o número de vítimas, mas o tempo em que essas fraudes puderam ocorrer sob o olhar aparentemente cego da administração pública. Como é possível que 41 entidades atuem livremente com descontos em folha sem uma verificação robusta de autorização? A resposta, infelizmente, está no tipo de gestão negligente que o sistema previdenciário brasileiro tem tolerado há décadas.

PAGAMENTO – A resposta oficial, embora articulada, soa defensiva. O presidente do INSS, Gilberto Waller, fez questão de repetir que o pagamento será feito diretamente pela folha e que o segurado não deve dar informações a ninguém. A ênfase na cautela — ainda que válida — escancara o receio de que o vácuo institucional seja explorado por novos golpistas. Mas há uma ironia cruel nisso: os próprios canais do governo já foram, de fato, explorados por supostas “associações” que tiveram acesso facilitado às folhas de pagamento.

É difícil acreditar que esse tipo de fraude seja realizado sem o envolvimento, direto ou indireto, de servidores ou prestadores de serviço ligados ao sistema. A DataPrev, que processa essas informações, também está no centro das atenções, e ainda assim, sua responsabilidade prática tem sido pouco debatida. Fala-se em “monitoramento”, mas não há qualquer indício de responsabilização efetiva por falhas que permitiram o início e a perpetuação dessas práticas.

Outro ponto que merece crítica é a reação da plataforma digital. A nota de protesto contra os “curiosos” que congestionam o sistema soa como um desvio de foco. Ora, se o número de vítimas é tão expressivo, não seria mais sensato reforçar os canais digitais, garantir estabilidade e transparência, ao invés de pedir silêncio da população? A curiosidade, nesse caso, é legítima — o medo de ser mais uma vítima é real.

ALENTO – A promessa de que não haverá prazo para a contestação é um alento tímido frente ao estrago causado. Mas o verdadeiro teste será a agilidade e transparência na devolução dos valores. E mais ainda: o governo tem a obrigação de fazer uma devassa nos processos de autorização de descontos em folha, auditar todas as entidades envolvidas e rever profundamente os critérios de cadastramento de associações no sistema previdenciário.

Se o Brasil quer mesmo proteger seus aposentados — aqueles que sustentam, com décadas de trabalho, a espinha dorsal do sistema —, precisa fazer muito mais do que ressarcir valores. Precisa punir os culpados, rever processos e assumir publicamente sua falha. Não basta dizer que “ninguém será deixado de fora”. O Estado já se ausentou demais. Agora, é hora de estar presente — com rigor, justiça e transparência.

INSS exibe a conivência silenciosa do Estado com o crime institucionalizado

Charge do J. Bosco (liberal.com)

Pedro do Coutto

A recente revelação do esquema de fraudes em larga escala contra aposentados e pensionistas do INSS expõe, mais uma vez, a fragilidade estrutural da máquina pública brasileira. A dimensão das irregularidades não deixa dúvidas de que houve envolvimento de pessoas com acesso privilegiado ao sistema. Trata-se de um golpe que só pôde ser sustentado ao longo do tempo por meio da conivência, ou ao menos da complacência, de agentes públicos com conhecimento técnico e institucional.

A investigação aponta para uma rede criminosa profundamente enraizada não apenas na estrutura do INSS, mas também com possíveis vínculos em outras esferas da administração federal e, quiçá, estadual. Dada a complexidade do esquema e o volume financeiro desviado, é evidente que o sistema de controle interno falhou – ou foi deliberadamente sabotado. A repetição dos lançamentos ilegais, sem que fossem detectados por auditorias ou sistemas de monitoramento, levanta sérias dúvidas sobre a efetividade da fiscalização.

LINHA DURA – A postura do governo federal diante da gravidade do caso tem sido, até agora, tímida. Essa hesitação institucional é preocupante, pois transmite à sociedade a mensagem de que crimes contra o erário, mesmo quando atingem diretamente a população mais vulnerável, não são enfrentados com a devida prioridade.

Mais alarmante ainda é o indicativo de que parte da estrutura de fiscalização pode continuar contaminada ou inerte. Não há como justificar a ausência de respostas contundentes após o escândalo vir à tona. A demora em promover uma devassa completa no órgão, afastar os suspeitos e reforçar os mecanismos de controle mina a credibilidade da atual gestão e alimenta a sensação de impunidade.

A omissão histórica em relação às fraudes na Previdência é um traço crônico da administração pública. Porém, o momento exige mais que discursos e promessas de correção: é preciso responsabilização efetiva, reformas estruturais e transparência no andamento das investigações. Qualquer tentativa de proteger envolvidos ou minimizar o impacto político e institucional do caso será compreendida como cumplicidade.

SAQUE – Não é aceitável que o INSS, responsável por zelar pela dignidade de milhões de brasileiros que dependem de seus benefícios, continue sendo tratado como um território de saque institucionalizado. O rombo causado pelos desvios, além de moralmente inaceitável, gera impactos econômicos significativos e compromete a confiança da população no Estado.

Por fim, o caso revela a urgência de uma política de integridade mais robusta e autônoma dentro dos órgãos públicos. A corrupção, quando não combatida com firmeza, corrói a legitimidade das instituições e agrava o já profundo fosso entre o cidadão e o Estado. A sociedade brasileira, especialmente seus aposentados e pensionistas, exige respostas à altura da ofensa cometida – e o governo precisa decidir de que lado da história deseja estar.

Na caixa-preta dos descontos indevidos, por que complicar o que já está claro?

Caso Stefanutto expõe as fissuras na máquina previdenciária brasileira

Ex-presidente do INSS revela “susto” com operação da PF

Pedro do Coutto

A operação da Polícia Federal que investiga um esquema bilionário de desvios na folha de pagamento de aposentados e pensionistas do INSS não apenas abalou os alicerces da maior autarquia federal, como trouxe à tona mais uma crise política silenciosa — e sintomática. No centro do escândalo, o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, que deixou o cargo em abril após ser afastado por ordem judicial, agora tenta se descolar do epicentro do furacão.

Em entrevista à CNN Brasil, Stefanutto adotou um discurso de surpresa e indignação. Disse ter sido acordado pela PF em uma cena “inesperada e difícil”, e garantiu que nunca havia se envolvido em qualquer investigação policial ao longo de sua carreira no serviço público. O tom, no entanto, pareceu mais de defesa do que de esclarecimento. Diante da gravidade dos fatos — e das cifras bilionárias em jogo —, o silêncio ou a surpresa não bastam.

DESCONTOS – A retórica do ex-presidente foca em medidas administrativas supostamente adotadas durante sua gestão para conter os chamados “descontos associativos” — um eufemismo, aliás, para a engrenagem de fraudes que agora se revela. Stefanutto faz questão de destacar que muitos dos mecanismos de segurança hoje utilizados foram criados por ele. Ainda assim, o escândalo estourou sob sua presidência, e a profundidade da suposta fraude levanta dúvidas incômodas sobre a real eficácia — ou seriedade — dessas medidas.

Seu afastamento e posterior demissão pelo presidente Lula da Silva foram lidos por muitos como uma tentativa do Planalto de conter o dano político antes que ele contaminasse o discurso de reconstrução institucional que o governo tenta sustentar. Stefanutto, por sua vez, parece ter entendido o gesto, afirmando que considera “natural” sua substituição diante do “desgaste”. Mas, como se sabe, em política, gestos raramente são apenas simbólicos.

CADERNOS – O caso ganhou contornos ainda mais delicados com a revelação, feita pelo jornal O Globo, da existência de cadernos apreendidos pela PF. Neles, constariam anotações que ligam Stefanutto a pagamentos indevidos — incluindo a enigmática menção “Stefa 5%”, supostamente uma alusão à sua parte no esquema. O ex-presidente preferiu não comentar, alegando que sua defesa ainda não teve acesso ao material. Uma resposta protocolar, mas que deixa no ar uma névoa de desconfiança.

A esta altura, o caso vai além da figura de Stefanutto. Ele escancara uma crise sistêmica no INSS, cujos processos internos parecem vulneráveis a esquemas que drenam recursos públicos enquanto milhões de brasileiros aguardam meses por um benefício. Mais do que uma operação da PF, o episódio é um retrato de como a combinação entre burocracia opaca e interesses corporativos pode abrir caminho para a corrupção — mesmo (ou especialmente) quando acompanhada de discursos sobre “legalidade e ordem jurídica”.

O caso Stefanutto é mais do que um episódio isolado de suspeita de corrupção; ele é sintomático de um problema estrutural que atravessa décadas na administração pública brasileira: a fragilidade dos mecanismos de controle interno, a captura institucional por interesses corporativos e a complacência do sistema político com zonas de opacidade administrativa. A folha de pagamentos do INSS, historicamente vulnerável, virou território fértil para esquemas que prosperam na conivência e na negligência.

DESAFIO – O governo Lula, embora tenha reagido com rapidez ao demitir Stefanutto, enfrenta agora o desafio de provar que há real intenção de reformar essas engrenagens corroídas. A substituição de nomes, por si só, não basta. O discurso anticorrupção só será crível se vier acompanhado de uma reforma técnica e profunda nos fluxos de auditoria, nos critérios de nomeações e no monitoramento de entidades conveniadas — muitas vezes operando à margem do interesse público.

Ao fim, o episódio revela o quão distante ainda estamos de um Estado verdadeiramente transparente, onde o zelo com o dinheiro público não dependa apenas da integridade pessoal de ocupantes de cargos-chave, mas de sistemas robustos, impessoais e fiscalizados com rigor. A pergunta que fica, portanto, não é apenas sobre a responsabilidade de Stefanutto — mas sobre o que será feito para que o próximo nome não repita, consciente ou inconscientemente, o mesmo roteiro.

Lembrando o colapso do Terceiro Reich e o fim da guerra na Europa

Data simboliza um ponto de inflexão moral e política

Pedro do Coutto

Na noite de 8 de maio de 1945, em Berlim, representantes do alto comando militar alemão colocaram um ponto final oficial na presença nazista no campo de batalha europeu. Com a assinatura da rendição incondicional, o Terceiro Reich reconheceu a derrota diante das forças aliadas ocidentais e do Exército Vermelho soviético. Assim, chegava ao fim um conflito iniciado quase seis anos antes, que devastou o continente.

A comunicação pública veio apenas no dia seguinte, quando a rádio alemã, ainda sob controle dos últimos remanescentes do regime, anunciou a rendição. A transmissão, carregada de formalidade militar, contrastava com o profundo impacto emocional vivido por milhões: alívio para os libertados, silêncio e vergonha para muitos dos vencidos.

AVANÇOS MILITARES – A trajetória que levou àquele desfecho teve início com os avanços militares relâmpago da Alemanha no início da guerra. A rápida ocupação de territórios como Polônia, França e Noruega deu à liderança nazista uma sensação ilusória de superioridade estratégica. Embalada por essas conquistas, a Alemanha lançou, em 1941, a invasão da União Soviética, numa operação de proporções colossais.

No início, a campanha oriental pareceu repetir o sucesso anterior: as tropas alemãs avançaram profundamente no território soviético, aproximando-se do Volga e cercando Stalingrado. Confiante, Hitler chegou a ironizar críticas internacionais, apostando que a cidade cairia em breve. No entanto, o cerco a Stalingrado acabou marcando uma reviravolta decisiva. Em fevereiro de 1943, o exército alemão que conduzia a ofensiva foi derrotado, e a esperança de uma vitória total começou a desmoronar.

Derrotas em múltiplas frentes se seguiram: a campanha no Norte da África foi perdida, e a abertura de um novo front com o desembarque aliado na Normandia, em 1944, acelerou o cerco à Alemanha. Nos meses seguintes, os soviéticos pressionaram pelo leste, enquanto os aliados avançavam pelo oeste.

RENDIÇÃO – Em meio ao colapso, Hitler se suicidou no subsolo da chancelaria em 30 de abril de 1945. Berlim, sitiada, capitulou dois dias depois. No entanto, os soviéticos exigiram uma rendição formal específica em sua zona de influência, o que levou à assinatura de um novo documento, no dia 8 de maio, em Karlshorst, distrito da capital alemã. A rendição foi chancelada por representantes das quatro grandes potências vencedoras: União Soviética, Reino Unido, Estados Unidos e França.

Mesmo após a rendição, a máquina de propaganda nazista tentou manter alguma aparência de controle. De Flensburg, onde Karl Dönitz – sucessor nomeado por Hitler – ainda exercia autoridade simbólica, foi ao ar o último boletim militar do regime, exaltando a resistência de combatentes isolados no front oriental.

Com o cessar-fogo, os horrores da guerra começaram a ser revelados em escala total. A destruição urbana, o saque ao patrimônio cultural europeu e, sobretudo, o massacre de milhões de vidas humanas expuseram a magnitude da tragédia. Estima-se que apenas na Europa, mais de 40 milhões de pessoas tenham perdido a vida durante o conflito.

TRIUNFO – A rendição da Alemanha nazista em 8 de maio de 1945 não representou apenas o encerramento de uma guerra, mas o colapso de um projeto totalitário construído sobre a negação da dignidade humana, o militarismo agressivo e a manipulação ideológica em escala inédita. A data marca o triunfo das forças que resistiram ao autoritarismo e, ao mesmo tempo, expõe a fragilidade das democracias quando subestimam ameaças emergentes.

O episódio oferece uma advertência clara: a expansão rápida de regimes baseados no culto à força, no desprezo às instituições e na desinformação pode ser inicialmente sedutora, mas invariavelmente conduz à destruição. O entusiasmo inicial que permitiu a ascensão do Terceiro Reich foi alimentado por vitórias militares aparentes e por uma retórica nacionalista que silenciou a crítica e perseguiu a diversidade. Ao fim, custou à Europa dezenas de milhões de vidas e um trauma coletivo cuja reconstrução levou décadas.

Mais do que um evento militar, o 8 de maio simboliza um ponto de inflexão moral e política. É um lembrete permanente de que a paz não é apenas a ausência de guerra, mas a presença de instituições fortes, memória histórica ativa e vigilância constante diante de discursos de ódio, autoritarismo e exclusão. Aprender com esse marco significa reconhecer que a liberdade e os direitos humanos nunca são conquistas definitivas — são compromissos que precisam ser reafirmados a cada geração.

Inflação alta de abril surpreende e reforça a pressão sobre juros

Alimentação e saúde afetam IPCA de abril

Pedro do Coutto

A inflação brasileira voltou a ganhar fôlego em abril, com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrando avanço de 0,43%, conforme divulgado na última sexta-feira. O resultado, impulsionado principalmente pelos segmentos de alimentação, bebidas, saúde e cuidados pessoais, reacendeu o alerta sobre a trajetória dos preços e trouxe novas dúvidas quanto ao rumo da política monetária.

O que mais chamou a atenção dos analistas, porém, foi o comportamento dos chamados núcleos da inflação — indicadores que excluem itens voláteis para captar tendências mais duradouras. A média desses núcleos avançou 0,50% no mês, sinalizando uma inflação mais resistente do que o esperado.

DEMANDA  – Entre os destaques do período, figuram a aceleração nos preços de bens industrializados — puxada por vestuário — e o avanço no setor de serviços, especialmente alimentação fora do lar e serviços pessoais. Esses componentes são tradicionalmente mais sensíveis ao nível de atividade econômica e, portanto, indicam uma demanda ainda aquecida.

Desde o final de 2024, a inflação de serviços tem se mantido elevada, oscilando entre 7,5% e 8% em termos anuais. Essa persistência sugere que o mercado de trabalho segue forte, o que sustenta o consumo das famílias e dificulta o processo de desinflação. Já a alta nos preços de bens industrializados pode refletir tanto o ritmo mais robusto da economia quanto os efeitos residuais da desvalorização cambial observada no fim do ano passado.

Apesar de alguns alívios pontuais — como a queda nos preços das passagens aéreas e o recuo nos alimentos consumidos no domicílio, especialmente os in natura —, o IPCA acumulado em 12 meses subiu para 5,53%, reforçando a percepção de um cenário inflacionário ainda desafiador.

FLEXIBILIZAÇÃO MONETÁRIA – Diante desse panorama, economistas avaliam que o ciclo de flexibilização monetária pode ser interrompido. A expectativa majoritária do mercado aponta para uma elevação de 0,25 ponto percentual na taxa Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para 18 de junho.

Em um contexto de inflação resiliente e atividade econômica firme, os dados de abril reforçam a ideia de que o Banco Central poderá adotar uma postura mais cautelosa, adiando eventuais cortes de juros para o último trimestre do ano.

DIAGNÓSTICO – O desempenho do IPCA em abril reforça o diagnóstico de uma inflação estruturalmente mais resistente, em grande parte alimentada por um mercado de trabalho ainda aquecido e pela força do consumo em serviços. A combinação de núcleos inflacionários elevados, aceleração em bens industrializados e ausência de sinais claros de arrefecimento nos componentes cíclicos desenha um cenário que impõe desafios relevantes à condução da política monetária.

A leitura dos dados sugere que o espaço para cortes adicionais na taxa Selic se estreitou substancialmente. Em vez disso, o Banco Central poderá ser compelido a interromper o ciclo de afrouxamento — ou até mesmo reverter parte dele — caso a pressão inflacionária persista nos próximos meses.

A manutenção da credibilidade da autoridade monetária exigirá, neste momento, uma comunicação firme e decisões calibradas com base em dados, evitando alimentar expectativas de acomodação diante de uma inflação que ainda mostra resiliência preocupante.

Fraude no INSS expõe dilema fiscal e reforça responsabilização de associações

Copom eleva Selic a 14,75% e sinaliza cautela diante de incertezas fiscais e globais

Fraude em descontos de aposentados expõe rede de corrupção institucional

Charge do Clayton (claytoncharges)

Pedro do Coutto

Durante a Operação Sem Desconto, deflagrada no dia 23, a Polícia Federal apreendeu cadernos com anotações que, segundo os investigadores, detalham a divisão de propinas em um sofisticado esquema de corrupção no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A investigação, conduzida em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU), apura descontos indevidos aplicados em aposentadorias e pensões, que podem ter causado prejuízo de até R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.

Os documentos foram localizados em Brasília, no escritório de Antonio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, apontado como lobista e articulador da rede de corrupção. Anotações como “Virgilio 5%” e “Stefa 5%” sugerem repasses percentuais a figuras-chave da instituição, entre elas o ex-procurador-geral Virgílio Oliveira Filho e o ex-presidente Alessandro Stefanutto, ambos afastados de seus cargos por determinação judicial.

ALEGAÇÃO – Embora a defesa de Stefanutto alegue que as menções não têm base factual nem valor probatório, os dados levantados pela PF indicam uma teia de favorecimentos. O mecanismo fraudulento consistia, essencialmente, na associação forçada de aposentados e pensionistas a entidades como sindicatos, sem o consentimento dos beneficiários. Em muitos casos, as assinaturas eram falsificadas, permitindo que fossem efetuados descontos mensais diretamente da folha de pagamento – prática legal apenas quando autorizada expressamente pelo titular do benefício, conforme legislação de 1991.

As investigações revelam a existência de uma rede empresarial voltada à ocultação dos recursos ilícitos. Entre 2023 e 2024, Antunes teria movimentado ao menos R$ 9,3 milhões para pessoas ligadas a servidores do INSS. Destacam-se repasses de R$ 7,5 milhões para empresas vinculadas à esposa do ex-procurador Virgílio Oliveira Filho e R$ 1,5 milhão para o escritório do filho do ex-diretor de Benefícios André Paulo Félix Fidelis. Outro ex-diretor, Alexandre Guimarães, teria recebido R$ 313 mil diretamente do lobista.

De acordo com o relatório policial, Antunes agia como intermediário técnico e financeiro entre entidades associativas e o INSS, sendo sócio de 21 empresas — 19 das quais abertas a partir de 2022. Pelo menos quatro delas estariam diretamente envolvidas no esquema, funcionando como canais para repasse de recursos desviados.

FRAUDE – A dimensão do caso coloca o INSS no centro de uma das maiores fraudes financeiras já apuradas em instituições públicas brasileiras. Estima-se que até quatro milhões de beneficiários tenham sido lesados. O governo federal, por sua vez, anunciou que prepara um plano para ressarcir as vítimas.

O caso revelado pela Operação Sem Desconto escancara não apenas a fragilidade dos mecanismos de controle interno do INSS, mas também a profundidade da captura institucional por interesses privados e redes de corrupção. A sistemática associação fraudulenta de aposentados e pensionistas a entidades, somada ao uso de estruturas empresariais para dissimular o repasse de propinas, aponta para um modelo de operação altamente organizado e difícil de detectar sem cruzamento intenso de dados financeiros e administrativos.

IMPACTO – Mais grave do que os valores envolvidos — estimados em bilhões — é o impacto direto sobre uma população vulnerável, que teve sua renda comprometida sem consentimento. O envolvimento de altos servidores e o uso de familiares e empresas de fachada para movimentar recursos mostram que o problema não se restringe a condutas individuais, mas evidencia falhas sistêmicas de governança, fiscalização e responsabilização no setor público.

Esse escândalo reforça a necessidade urgente de reformular os processos de controle sobre descontos em folha, revisar os critérios para acordos com entidades de classe e ampliar a transparência na gestão dos benefícios previdenciários. Sem medidas estruturais, o sistema permanecerá vulnerável à atuação de intermediários que exploram brechas legais e operacionais em detrimento dos direitos dos cidadãos.

Após saída de Lupi, governo Lula tenta conter crise no INSS e evitar CPI

Charge do Cazo (blogdoaftm.com.br)

Pedro do Coutto

Governo enfim busca uma solução para ressarcir vítimas de fraude no INSS

Charge do Gilmar Fraga (gauchazh.clicrbs.com.br)

Pedro do Coutto

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, reafirmou o compromisso do governo federal com o ressarcimento dos aposentados que sofreram descontos indevidos por fraudes envolvendo convênios com o INSS. Embora a Fazenda esteja alinhada com a necessidade de indenizar os prejudicados, Durigan enfatizou que qualquer medida adotada deverá respeitar os limites estabelecidos pelo novo arcabouço fiscal.

Com o ministro Fernando Haddad em viagem oficial, Durigan assumiu as articulações interministeriais sobre o tema e sinalizou que, para garantir os pagamentos, o governo terá de remanejar recursos do Orçamento já existente.

VERBAS – Entre as rubricas cogitadas estão verbas destinadas ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e às emendas parlamentares — áreas que concentram significativa parcela do orçamento público. A alternativa mais provável envolve o bloqueio de parte desses recursos para acomodar as despesas emergenciais.

A discussão ocorre enquanto o governo enfrenta o desafio de quantificar com precisão os danos causados pelas fraudes. Estimativas iniciais da Controladoria-Geral da União apontam impacto potencial de R$ 6,3 bilhões, enquanto dados do INSS sugerem um valor mais modesto, na casa de dezenas de milhões. Ambos os levantamentos foram feitos por amostragem, o que dificulta uma avaliação exata e rápida da extensão do prejuízo.

No campo jurídico, a Advocacia-Geral da União já iniciou os procedimentos preparatórios para responsabilizar as entidades envolvidas por meio de ações regressivas e de improbidade administrativa. Contudo, esses trâmites judiciais são reconhecidamente morosos e não atendem à urgência exigida pelo presidente Lula, que determinou prioridade máxima ao ressarcimento dos aposentados.

RESISTÊNCIA – Enquanto alternativas são discutidas, o Ministério da Previdência resiste à ideia de usar seu próprio orçamento, alegando que seus recursos já estão comprometidos com o pagamento de benefícios regulares. A controvérsia expõe a complexidade da operação: é preciso indenizar rapidamente milhões de vítimas sem comprometer programas estruturantes ou infringir a nova regra fiscal.

Em meio a impasses orçamentários e incertezas sobre o valor exato dos prejuízos, o governo federal caminha sobre uma corda bamba: busca reparar com celeridade o dano causado a milhões de aposentados, mas sem romper os limites do arcabouço fiscal ou prejudicar investimentos estratégicos. A pressão por uma resposta ágil cresce, e as escolhas feitas nas próximas semanas indicarão qual prioridade pesará mais: o compromisso com a responsabilidade fiscal ou a reparação imediata das vítimas.

Com CPI do INSS, oposição mantém pressão contra governo Lula

Charge do Cláudio de Oliveira (folha.uol.com.br)

Pedro do Coutto

O escândalo de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) levou à queda do ministro da Previdência, Carlos Lupi. Ainda assim, a oposição segue pressionando o governo do presidente Lula e mantém o plano de instaurar uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar os descontos indevidos em aposentadorias.

A saída de Lupi marca a 11ª mudança ministerial no atual mandato de Lula. Filiado ao PDT, ele deixou o cargo após investigações da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União revelarem um esquema de fraudes no INSS estimado em R$ 6,3 bilhões. Mesmo com a mudança no comando da pasta, a oposição continua firme. Parlamentares afirmam já ter colhido assinaturas suficientes para a criação da CPMI, composta por membros da Câmara e do Senado. A comissão poderia ganhar prioridade caso o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, leia o requerimento de instalação em uma sessão conjunta do Congresso.

NOMEAÇÃO – “Nós só vamos permitir sessão congressual se a CPMI for instalada”, declarou o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho, que lidera a articulação. Logo após a saída de Lupi, Lula nomeou Wolney Queiroz, então secretário-executivo da Previdência e seu braço direito, como novo ministro. Horas depois, Wolney publicou uma foto ao lado do presidente, já empossado.

Ex-deputado federal por Pernambuco e também do PDT, Wolney foi escolhido para manter o apoio do partido ao governo e tentar estancar a crise política. O Planalto aposta em sua habilidade de articulação no Congresso para conter o avanço da CPMI e proteger a imagem do presidente.

Além da política, Wolney terá a missão de colaborar com o novo presidente do INSS, Gilberto Waller Jr., e com a Advocacia-Geral da União para agilizar o ressarcimento das vítimas das fraudes — ação considerada prioritária por Lula. Segundo a ata de uma reunião do Conselho Nacional do INSS, em junho de 2023, Wolney esteve presente quando a conselheira Tonia Galleti alertou sobre os descontos indevidos. Na ocasião, ele recomendou acionar o responsável pela certificação dos bancos de dados da Dataprev.

CONVOCAÇÃO –  A CPI, se instalada, poderá convocar suspeitos de envolvimento no esquema bilionário que vitimou aposentados e pensionistas. O objetivo da oposição é expor falhas estruturais e eventuais omissões do governo, já que Lupi teria sido alertado, mas não agiu com a devida rapidez.

Este cenário oferece à oposição a chance de transformar o escândalo em capital político para 2026, quando Lula deve buscar a reeleição. As fraudes, no entanto, parecem revelar um problema mais profundo: a atuação de grupos ocultos dentro da Previdência Social, que administra recursos superiores a R$ 1 trilhão por ano. Milhões de beneficiários são vulneráveis a crimes financeiros em larga escala.

REVELAÇÕES – Como mostram experiências anteriores, a CPI tende mais a revelar os bastidores do poder do que a punir diretamente os envolvidos. Ainda assim, os danos à imagem do governo são reais e podem ter impacto nas urnas. Vale lembrar que a vitória de Lula em 2022 veio com uma margem estreita de apenas 1,5%.

A Comissão poderá redefinir os rumos da política nacional. Porém, isso não garante uma vitória automática da oposição, já que o governo pode usar a própria CPI para mostrar disposição em esclarecer os fatos com transparência. Será uma disputa de narrativa, tempo e habilidade para iluminar as zonas de sombra que permitiram a fraude.

Lupi não resiste, pede demissão, mas o INSS continua sob domínio do PDT

Lupi cai após o escândalo dos descontos irregulares

Pedro do Coutto

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, pediu demissão ao presidente Lula da Silva em reunião na última sexta-feira. A saída ocorre como consequência do enfraquecimento do pedetista após a operação da Polícia Federal para investigar cobranças indevidas feitas por entidades na folha de pagamento de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social.

O governo já anunciou o substituto de Lupi, que será um aliado dele e outro nome ligado ao PDT: o ex-deputado federal Wolney Queiroz, atual secretário-executivo da pasta. “Entrego a função ao presidente Lula, a quem agradeço pela confiança e pela oportunidade”, pronunciou-se Lupi, pelas redes sociais, após a reunião. “Tomo esta decisão com a certeza de que meu nome não foi citado em nenhum momento nas investigações em curso, que apuram possíveis irregularidades no INSS. Faço questão de destacar que todas as apurações foram apoiadas, desde o início, por todas as áreas da Previdência, por mim e pelos órgãos de controle do governo Lula”, seguiu.

INVESTIGAÇÕES – Lupi disse ainda esperar “que as investigações sigam seu curso natural, identifiquem os responsáveis e punam, com rigor, aqueles que usaram suas funções para prejudicar o povo trabalhador”. A ação da PF, batizada de Sem Desconto, resultou no afastamento de membros da cúpula do órgão. No mesmo dia, Lula demitiu o então presidente do instituto, Alessandro Stefanutto. Lupi havia indicado o profissional.

Inicialmente, a avaliação era que o ministro se manteria no cargo, uma vez que não havia elementos que o implicassem no escândalo. No entanto, pesou o fato de que Lupi foi avisado, ainda em 2023, sobre as irregularidades e não tomou providências. Com a demissão de Carlos Lupi, encerra-se um capítulo confuso na história da Previdência Social. Mas, o problema maior, colossal mesmo, permanece, sobretudo em face da decisão do governo de fazer a devolução das quantias que os criminosos roubaram de milhares de aposentados e pensionistas do INSS.

Não será uma tarefa fácil. Será preciso fazer um levantamento sobre os descontos efetuados em virtude de solicitações anteriores de crédito consignado. Estamos diante de um montante de milhões de segurados atingidos pelo esquema. Feita a averiguação sobre tão grande número de pessoas, os cálculos serão feitos para as devidas devoluções. Nessa altura dos acontecimentos, a transformação do dinheiro roubado em bens adquiridos em decorrência já estão sendo bloqueados pelos ladrões e colocados diante de barreiras que existem na legislação brasileira.

DIFICULDADE – Uma reportagem do O Globo focalizou amplamente o assunto na edição de ontem. Por ela se chega à conclusão sobre a extrema dificuldade que será o projeto de devolução dos desvios, deixando claro rombos enormes nas folhas de pagamentos. Os esforços para ressarcir os descontos efetuados vão se deparar com a soma de R$ 6,3 bilhões.

A devolução do mês de abril está assegurada por decisão do governo e será imediata. Mas e os outros meses? Fica a questão que representa um grande desafio para o governo, sobretudo diante da proximidade das eleições de 2026.E stamos diante de uma enorme quantidade de pontos financeiros a serem conferidos no espelho da verdade.

81 deputados de partidos da Esplanada de Lula apoiam CPI do INSS

Charge do Cláudio de Oliveira (folha.uol.com.br)

Pedro do Coutto

O requerimento para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o esquema de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social foi assinado por 81 deputados de partidos que integram o governo do presidente Lula da Silva. Nenhum dos 68 deputados do PT  apoiou a criação do colegiado.

O autor do pedido, deputado Coronel Chrisóstomo, conseguiu 185 das 171 assinaturas necessárias e protocolou o requerimento na Câmara dos Deputados. Agora, cabe ao presidente da Casa Baixa, Hugo Motta, analisar o pedido. Ele não deve decidir de imediato.

APOIOS – O União Brasil deu 25 apoios à CPI, ficando atrás só do PL, do ex-presidente Jair Bolsonaro. Isso equivale a 41,67% da bancada, que tem 60 deputados federais. O partido tem os ministros do Turismo, Celso Sabino, e das Comunicações, Frederico de Siqueira Filho, no governo Lula. O PP contribuiu com 18 assinaturas. O partido tem o Ministério do Esporte, com André Fufuca. Apesar disso, o presidente da sigla, senador Ciro Nogueira, é aliado de Bolsonaro e foi ministro da Casa Civil no governo bolsonarista.

Na bancada do Republicanos, também 18 dos 44 deputados assinaram o requerimento. O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, é do partido. No PSD, 9 dos 44 deputados assinaram. O partido tem os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, de Agricultura, Carlos Fávaro, e Pesca, André de Paula. Na bancada do MDB, que tem três ministérios no governo Lula, menos deputados assinaram o pedido: 11 de 44. Os ministros do Planejamento, Simone Tebet, Cidades, Jader Barbalho Filho, e dos Transportes, Renan Filho, são da cota do partido.

No fundo da questão, a pressão levou os 81 deputados que compõem a base política do governo na Câmara Federal a assinarem a CPI que investigará a corrupção no INSS. O fator de motivação foi assegurar o funcionamento da CPI que precisava apenas de 171 apoios para que fosse constituída. Muitos dos parlamentares têm assento no governo.

OPINIÃO PÚBLICA – Porém, as suas rubricas na composição da CPI demonstra que era praticamente impossível negar o apoio a uma iniciativa que vai ao encontro da opinião pública, pois a sociedade brasileira está reagindo contra a corrupção e o governo reconhece isso. Tanto que o próprio Lula escolheu o novo presidente do Instituto, deixando de lado a atuação de Carlos Lupi, ministro da Previdência Social.

Lupi se omitiu e o escândalo explodiu. Vários bilhões foram roubados dos segurados durante anos. Lula entrou numa defensiva tão forte diante da cadeia dos fatos que não participou de nenhuma manifestação no dia 1º de maio. O presidente sentiu-se exposto à cobrança pública mais concreta. Ele fala em devolver o dinheiro aos aposentados e pensionistas, mas o problema é muito maior do que parece à primeira vista. O roubo não foi contra o INSS, mas através do Instituto.

O que está em jogo não é o Tesouro Nacional, mas o crime contra milhares de segurados da Previdência Social que tiveram as suas contas devassadas e delas sacado dinheiro de forma ilegal. Se o governo já optou pela devolução dos recursos, indica que os criminosos não o devolverão?  Não foi por falta de informação que Lupi deixou de agir. Ele sabia dos fatos.

Procurador Gilberto Waller Jr. presidirá o INSS após escândalo de fraudes bilionárias

Ressarcimentos do INSS podem exigir realocação de verba, diz Tesouro

Ceron afirma que o INSS é o responsável por fazer o pagamento

Pedro do Coutto

O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse na última terça-feira, que o ressarcimento dos desvios indevidos de benefícios do INSS pode exigir realocações no Orçamento Federal. Segundo ele, seria “natural” em uma eventual necessidade. Uma investigação da Polícia Federal mostrou em abril que associações e sindicatos conseguiram aproximadamente R$ 6,5 bilhões com esquema de retenção indevida de 2019 a 2024. Se todos os valores não forem recuperados, essa seria a quantidade desembolsada pelos cofres públicos para bancar a compensação. A Previdência tem um Orçamento trilionário.

“Pode eventualmente ter que tirar um adicional de alguma outra pasta para poder atender uma despesa de outro órgão. Isso é natural. Está tudo bem. E faz parte ali do processo”, declarou Ceron. O secretário afirmou mais de uma vez que a competência das devoluções é do INSS e que suas análises dizem respeito às visões da equipe econômica.

AGENDA – Segundo ele, o dinheiro economizado com revisões de cadastros em benefícios sociais também poderia ser utilizado para bancar o ressarcimento. “Tem toda uma agenda de revisão cadastral do INSS que tem gerado resultados e pode ser intensificada inclusive para abrir margem para acomodar esse tipo de ressarcimento, ainda que seja uma antecipação”, disse.

Uma realocação no Orçamento viria no Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas. O documento faz congelamentos nas verbas públicas para evitar aumentos excessivos nos gastos que prejudiquem as metas fiscais.

Segundo a Polícia Federal, sindicatos e associações realizavam um Acordo de Cooperação Técnica com o INSS para oferecer benefícios aos aposentados associados.  O acordo permitia que as entidades realizassem um desconto de “mensalidades associativas” na folha de pagamento dos beneficiários.

CADASTRO – Tais entidades cadastraram os aposentados sem a autorização, utilizando documentos e assinaturas falsas. As investigações indicam que não tinham estrutura para manter os serviços oferecidos. Com isso, falsificavam assinaturas para associar o pensionista a entidades e realizar os descontos automáticos na folha de pagamento dos beneficiários.

A Controladoria também identificou que 70% das 29 entidades analisadas não entregaram a documentação completa ao INSS. A PF informou que apreendeu carros de luxo, dinheiro em espécie, joias e quadros. Os valores totais e a quantidade exata ainda estão em levantamento.

No fundo da questão, a verdade é que no fim das contas o governo acabará tendo que pagar R$ 6 bilhões aos aposentados e pensionistas do INSS que foram vítimas de um roubo colossal tramado por criminosos. E agora, quando se fala em devolver o dinheiro, o governo federal para poder equilibrar o que ocorreu terá que injetar recursos do Tesouro para cobrir os prejuízos mais prováveis. Vejam a quanto anda as atividades, características de ações que perduraram por anos.

OMISSÃO – Essa despesa, assim, não era prevista, mas terá que ser concretizada através de recursos que sairão dos bolsos da própria sociedade. Impressionante como nada foi feito durante todo esse período, inclusive com o fato de o ministro Carlos Lupi não ter dado a devida importância aos fatos, omitindo-se completamente .

É preciso ver como a falsificação ocorreu para que os responsáveis possam ser penalizados. O governo tenta reverter a crise, passando a usar um tom a favor da apuração das responsabilidades. Mas isso é uma obrigação. É incrível como ainda aconteçam coisas desse tipo no Brasil.

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Omissão de Lupi poderá ter reflexos na disputa presidencial de 2026

Lupi reconheceu demora do INSS para investigar fraude

Pedro do Coutto

Numa entrevista à repórter Geralda Doca, O Globo, o ministro Carlos Lupi afirmou que sabia o que estava acontecendo no INSS em matéria de descontos ilegais para entidades fictícias, mas que só poderia agir diante de provas concretas dentro de um ritmo que marca questões desse tipo na área do governo federal.

Porém, se ele sabia o que estava acontecendo desde 2023, por que não tomou providências mínimas a respeito do caso? Se havia identificado os pontos de fraude, os empréstimos consignados para entidades que não forneceram recursos, por que ficou em silêncio? A entrevista só piorou a sua situação. Setores do governo defendem a sua demissão e acham que ele deveria tomar a iniciativa de sair até para resguardar o presidente Lula.

ALERTA – A postura de Lupi acendeu o forte sinal de alerta diante do fato que, mesmo que o escândalo tenha começado no governo Bolsonaro, multiplicou-se na gestão petista. Ocupando um cargo de confiança, Carlos Lupi foi informado sobre a fraude no início do governo. Depois, em junho a comunicação sobre a fraude foi registrada em ata – ou seja formalizada.

Os movimentos para conter um esquema de fraude que chegou ao número de R$ 6 bilhões em aposentadorias e pensões do INSS desviados, sendo a maior parte deles no governo petista, foi muito tímida. Lupi foi omisso ao assumir que sabia do caso, aproveitando até para colocar a culpa no próprio governo pela inação e demora.

BOLA FORA – “No governo, tudo é demorado. Eu sabia o que estava acontecendo, das denúncias. Eu sabia que estava havendo um aumento muito grande [dos descontos nas mensalidades], que precisava fazer uma instrução normativa para acabar com isso e comecei a me irritar pela demora. Só que o tempo no governo não é o tempo de uma empresa privada”, afirmou o ministro para a jornalista Geralda Doca.

A declaração aumentou o descontentamento no Palácio do Planalto. O que o mantém no cargo hoje é a fragilidade do governo na relação com o Congresso e proximidade da eleição de 2026.

A Previdência é um setor dos mais críticos, pois os roubos praticados de cifras bilionárias atingiram diretamente aposentados e pensionistas. Os descontos têm esse aspecto cruel. Lupi não se mostra disposto a se demitir, mas a sua posição é insustentável. Ele tinha obrigação de agir e denunciar a trama sinistra que se dissolvia nos porões no INSS.  Foi um desastre para o presidente Lula o que ocorreu na Previdência Social.